domingo, 24 de abril de 2016

Má gestão de água e desperdício de recursos hídricos


Por Roberto Naime.



Que ocorrem má gestão de água e desperdício de recursos hídricos em geral, não existe mais a menor dúvida. E não é só por causa das perdas astronômicas na distribuição.
Milhões de pessoas vivem em regiões em que os níveis dos reservatórios estão abaixo do normal e a quantidade de chuvas é menor que a média histórica.

Ao longo de 2014, a seca levou 1.265 municípios de 13 estados do Nordeste e do Sudeste a decretarem situação de emergência, de acordo com dados do Ministério da Integração Nacional. Racionamento, problemas de abastecimento ou reservatórios em níveis de alerta já são realidade em muitas regiões metropolitanas do país.
Diante desse cenário de crise hídrica, Glauco Kimura de Freitas, especialista em Recursos Hídricos e coordenador do Programa Água para a Vida do WWF-Brasil, analisa, entre outros aspectos, as principais causas do problema, os impactos do racionamento de água na vida dos cidadãos, e as medidas que a agricultura, indústria e os consumidores domésticos devem adotar com urgência para economizar esse recurso.
Glauco Kimura de Freitas é biólogo e atuou como gerente do Programa Aliança dos Grandes Rios pela “The Nature Conservancy”. Tem experiência na área de Biologia Geral, com ênfase em Biologia da Conservação, atuando principalmente no manejo e controle de espécies invasoras; Cerrado; Pantanal; regimes hidrológicos naturais em rios; conservação de ecossistemas aquáticos e sua adaptação às mudanças climáticas.
Perguntado sobre quais as principais razões da crise hídrica que o país parece que eterniza, manifestou que é “má gestão por parte dos órgãos responsáveis, anos consecutivos de seca atípica, falta de preservação de mananciais e de medidas concretas de combate ao desperdício de água tratada.
Quando interrogado sobre que impactos racionamentos podem provocar na rotina dos cidadãos, da cidade e das atividades econômicas, argui que “para os cidadãos interfere de forma muito negativa no seu cotidiano, principalmente daqueles que moram em regiões mais altas onde a água acaba primeiro e é dos últimos lugares a voltar. Ou seja, a condição de até cinco dias semanais sem água afeta até mesmo a dignidade das pessoas. Mas a cidade como um todo pode ser impactada pela redução do movimento do comércio, interrupção de serviços de lazer, desaceleração da economia e desemprego. Algumas empresas estão migrando suas fábricas para outras regiões sob menor grau de risco hídrico no Paraná e Mato Grosso, por exemplo”.
Sabendo que 10% da água abastecida são destinadas ao uso doméstico, 20% para a indústria e 70% para a agricultura, como tornar a agricultura e a indústria mais sustentáveis no uso da água, ele responde que “a agricultura precisa inovar com técnicas mais eficientes de irrigação. Para ser mais sustentável deveria empregar métodos de irrigação localizada, como por exemplo, o gotejamento e a microaspersão. Embora tenham um custo inicial mais alto e requeiram mudanças no tipo de trato do solo e sementes, são mais conservadores de água porque a distribuem de forma lenta, uniforme e diretamente na zona radicular. Já na indústria, onde os processos normalmente são de circuito fechado e por isso mais controláveis, as fábricas e unidades de produção precisam investir em medidas de reuso e em plantas próprias para tratamento de efluentes. Portanto, o que é mais urgente para a agricultura é coibir o desperdício e a ineficiência, de fato reduzindo a aspersão com pivô central, ou mesmo a interrompendo em casos mais extremos, e para o setor industrial cabe instaurar a tecnologia de reuso de água imediatamente”.
Quanto ao consumo doméstico, quais medidas deveriam ser implementadas para reduzir o consumo e mudar hábitos ele pondera, “nas residências, além de hábitos básicos como não se barbear e escovar os dentes com a torneira aberta ou tomar banhos muito prolongados, reutilizar a água da máquina de lavar para regar as plantas, a água do banho para a descarga e acumular de forma adequada a água das chuvas, são medidas que levam a redução do consumo”.
Provocado sobre relatório do governo federal divulgado recentemente que mostra que 37% da água tratada para consumo é perdida antes de chegar às torneiras da população, especialmente por falhas nas tubulações, fraudes e ligações clandestinas. Como mudar esse quadro, aduz que “as autoridades responsáveis pelo abastecimento devem investir na reforma das tubulações antigas, no caso de São Paulo alguns pontos possuem mais de 40 anos. Além de fiscalizar e combater seriamente as ligações clandestinas e promover campanhas de redução de consumo e uso racional da água”.
A população deve sempre denunciar vazamentos e fraudes na rede, consertar vazamentos em suas casas, além de se conscientizar de que o consumidor também é responsável por gerir os problemas hídricos das grandes cidades sendo, portanto, parte da solução.
Sobre a Lei de Recursos Hídricos define que a governança da água deve ser por bacias, por meio dos Comitês de Bacias. Provocado a se manifestar se estes comitês estão operando bem, manifesta finalizando que “infelizmente, dos cerca de 200 comitês de bacias (estaduais ou federais) instaurados no Brasil, no máximo 15% operam bem. O comitê de bacia é o espaço onde a sociedade civil possui voz quanto à gestão dos recursos hídricos. No momento atual de crise hídrica nacional, devem, além de viabilizar a cobrança pelo uso da água dos usuários da bacia (mecanismo previsto em lei), exigir a rápida implementação de medidas emergenciais, tais como, reuso, redução do consumo e interrupção da renovação ou emissão de novas outorgas de uso da água”.

Fonte: EcoDebate