segunda-feira, 18 de julho de 2016

BRASIL: Lider Mundial no uso de agrotóxico.



Além de permitir o uso de pesticidas proibidos em outros países, o Brasil ainda exonera os impostos dessas substâncias.
O morango vermelho e carnudo e o espinafre verde-escuro de folhas largas comprados na feira podem conter, além de nutrientes, doses altas demais de resíduos químicos.
Estamos em 2016 e no Brasil ainda se consomem frutas, verduras e legumes que cresceram sob os borrifos de pesticidas que lá fora já foram banidos há anos. A quantidade de agrotóxicos ingerida no Brasil é tão alta, que o país está na liderança do consumo mundial desde 2008.
Desde este ano, o Brasil ocupa o primeiro lugar no ranking mundial de consumo de agrotóxicos.
A Abrasco alerta que 70% dos alimentos in natura consumidos no país estão contaminados por resíduos de pesticidas
Os números falam por si nos últimos dez anos o mercado mundial desse setor cresceu 93%, já no Brasil, esse crescimento foi de 190%, de acordo com dados divulgados pela Anvisa.
Segundo o Dossiê Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva) – um alerta sobre o impacto dos agrotóxicos na saúde, 70% dos alimentos in natura consumidos no país estão contaminados por agrotóxicos.
Desses, segundo a Anvisa, 28% contêm substâncias não autorizadas.
“Isso sem contar os alimentos processados, que são feitos a partir de grãos geneticamente modificados e cheios dessas substâncias químicas”, diz Karen Friedrich, da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz, ao lado).
De acordo com ela, mais da metade dos agrotóxicos usados no Brasil hoje são banidos em países da União Europeia e nos Estados Unidos.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), entre os países em desenvolvimento, os agrotóxicos causam, anualmente, 70.000 intoxicações agudas e crônicas.
A boa notícia, é que naquele mesmo ano, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) iniciou a reavaliação de 14 pesticidas que podem apresentar riscos à saúde.
A má notícia é que até agora os estudos não terminaram.
Governo concede reduções e isenções de impostos para produção e comercialização de agrotóxicos
A essa morosidade somam-se incentivos fiscais.
O Governo brasileiro concede redução de 60% do ICMS (imposto relativo à circulação de mercadorias), isenção total do PIS/COFINS (contribuições para a Seguridade Social) e do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) à produção e comércio dos pesticidas.
A constação é de João Eloi Olenike (ao lado), presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT).
O que resta de imposto sobre os agrotóxicos representam, segundo Olenike, 22% do valor do produto. “Para se ter uma ideia, no caso dos medicamentos, que não são isentos de impostos, 34% do valor final são tributos”, diz.
Bela Gil liderou movimento contra carbofurano usado em lavouras de algodão, feijão, banana, arroz e milho
Recentemente, o consumo de agrotóxicos esteve novamente no centro da discussão. A apresentadora Bela Gil, que tem mais de 590.000 seguidores no Facebook, liderou um movimento para que a população se mostrasse contrária ao uso do carbofurano, substância usada em pesticidas em lavouras de algodão, feijão, banana, arroz e milho.
Isso ocorreu quando a Anvisa colocou em seu site uma consulta pública sobre essa substância.
Antes de Bela Gil (abaixo) publicar um texto engajando seus seguidores, o resultado se mostrava favorável à continuação do uso desse agrotóxico.
Mas em poucas horas, a apresentadora conseguiu reverter o resultado da consulta, mostrando que os brasileiros querem que essa substância seja proibida também no Brasil, assim como já é em países como Estados Unidos, Canadá e em toda aUnião Europeia.
Por e-mail, a chefe de cozinha adepta da culinária natureba disse por que liderou a campanha. “Já existem estudos revelando a toxicidade e os perigos do carbofurano”, disse.
“Essa substância é cancerígena, desregula o sistema endócrino em qualquer dose relevante e afeta o sistema reprodutor”.
Na bula do produto consta a informação de que essa substância é “muito perigosa ao meio ambiente e altamente tóxica para aves”. Orienta o usuário a não entrar nas lavouras que receberam o produto por até 24 horas após a aplicação “a menos que se use roupas protetoras”.
2,4-D e a polêmica do ‘agende laranja’ usado na Guerra do Vietnã
Há exatos dez anos, desde 2006, a Anvisa está reavaliando os riscos à saúde que o herbicida 2,4-D pode causar.
De nome estranho, essa substância era uma das que formavam o chamado Agente Laranja, uma química que foi amplamente utilizada pelas Forças Armadas norte-americanas durante a guerra do Vietnã.
Seu uso, naquele momento, era para destruir plantações agrícolas e florestas que eram usadas como esconderijo pelos inimigos. Mas, segundo a Cruz Vermelha, cerca de 150.000 crianças nasceram com malformação congênita em consequência dessa substância. Os Estados Unidos contestam esse número.
Por meio de nota, a Anvisa afirmou que o parecer técnico de reavaliação do 2,4-D foi recentemente finalizado e deverá ser disponibilizado para consulta pública no portal da Anvisanos próximos meses.
A consulta pública faz parte do processo de reavaliação das 14 substâncias realizado pela Anvisa (veja o quadro abaixo).
Seis pesticidas foram banidos e dois permanecem
Desde o início dos estudos, em 2008, seis pesticidas foram banidos e dois foram autorizados a permanecer no mercado sob algumas restrições. Resta a conclusão dos estudos de outras seis substâncias – dentre elas o carbofurano.
OMS considera glifosato cancerígeno
O glifosato, usado para proteger lavouras de milho e pasto, e que no ano passado foi considerado cancerígeno pela Organização Mundial da Saúde, também está nesta lista que aguarda conclusões.
A demora para finalizar essa reavaliação fez o Ministério Público entrar com uma ação, em junho do ano passado, pedindo maior agilidade no processo. Na época, a Justiça acatou o pedido e estabeleceu um prazo de 90 dias para que todos os estudos fossem concluídos. Mas o setor do agronegócio também se moveu.
O Sindicato Nacional das Indústrias de Defesa Vegetal (Sindivag) entrou com um recurso alegando que o prazo não era suficiente.
Em nota, o Sindivag afirmou ser “favorável ao procedimento de reavaliação”, mas que “o prazo concedido para conclusão da reavaliação não era suficiente para que fossem adotados todos os procedimentos previstos nas normas vigentes”.
O processo está agora na Justiça Federal, que informou não haver prazo para o julgamento.
Em nota, o Sindivag afirmou ser “favorável ao procedimento de reavaliação”, mas que “o prazo concedido para conclusão da reavaliação não era suficiente para que fossem adotados todos os procedimentos previstos nas normas vigentes”.
O processo está agora na Justiça Federal, que informou não haver prazo para o julgamento.
Apesar da demora, as reavaliações dos agrotóxicos são um passo importante para a discussão do consumo dessas substâncias no Brasil.
“A consulta pública da Anvisa sobre o carbofurano foi importante para que o órgão e os especialistas envolvidos obtivessem conhecimento do que a população pensa”, diz Bela Gil.
“A Anvisa pode se sentir mais inclinada a tomada de decisão de realmente banir esse agrotóxico”.
Para Wanderlei Pignati, professor de Medicina da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), a lentidão desse processo ocorre porque há uma forte pressão de setores interessados na comercialização dessas substâncias.
“As empresas querem fazer acordo, mas não deveria caber recurso”, diz. “Queremos proibir todos os [agrotóxicos] que são proibidos na União Europeia”, afirma. “Por que aqui são consumidos livremente? Somos mais fortes que eles e podemos aguentar, por acaso?”.
Agrotóxicos deveriam ter altos tributos e não ser isentos, o governo deveria fazer uma revisão
Segundo João Olenike, do IBPT, os agrotóxicos deveriam ter altos tributos, e não ser isentos. “Existe uma coisa chamada extra-fiscalidade, que significa que, além da arrecadação, o tributo tem também uma função social”, explica.
“Por isso, tributa-se muito a bebida alcoólica e o cigarro: para desestimular seu consumo”.
Para ele, deveria-se fazer o mesmo com os pesticidas. “O que valia na década de 70, [quando foi lançado o Plano Nacional da Agricultura], não vale para hoje. O Governo deveria fazer uma revisão”.
Os alimentos mais contaminados pelos agrotóxicos
Em 2010, o mercado brasileiro de agrotóxicos movimentou 7,3 bilhões de dólares e representou 19% do mercado global. Soja, milho, algodão e cana-de-açúcar representam 80% do total de vendas nesse setor.

Perguntas e respostas sobre os agrotóxicos
Lavar os alimentos antes de consumi-los retira os agrotóxicos?
Não. Lavar os alimentos pode contribuir para que apenas parte das substâncias sejam retiradas, mas eles continuarão contaminados pelos agrotóxicos.
Água sanitária retira os agrotóxicos dos alimentos?
Não. Segundo a Anvisa, até o momento não existem evidências científicas que comprovem a eficácia da água sanitária ou do cloro na remoção ou eliminação de resíduos dos agrotóxicos nos alimentos. A Anvisa orienta que se use uma solução de uma colher de sopa de água sanitária diluída em um litro de água com o objetivo apenas de matar agentes microbiológicos que possam estar presentes nos alimentos.
Selo Brasil Certificado – Agricultura de Qualidade não garante isenção do uso de agrotóxicos, mas que os alimentos são controlados
Como diminuir a ingestão de agrotóxicos?
O ideal seria optar pelos alimentos orgânicos, que venham com o certificado Produto Orgânico Brasil, um selo branco, preto e verde.
Como esses alimentos são mais caros e não estão disponíveis em todo mercado, há outras possibilidades, como escolher produtos com o selo Brasil Certificado: Agricultura de Qualidade.
Esse selo não garante a isenção do uso de agrotóxicos, mas significa que a origem do alimento é controlada, o que aumenta o comprometimento de produtores com a qualidade do alimento.
Além disso, recomenda-se o consumo de alimentos da época que, normalmente, recebem menos agrotóxicos para serem produzidos.
Fonte:Envolverde.

Estudo revela que 30% dos solos do mundo estão degradados.



Ameaças como compactação, desequilíbrio de nutrientes e perda de matéria orgânica atingem quase um terço das terras do Planeta. Um amplo estudo envolvendo 600 pesquisadores de 60 países mostrou que mais de 30% dos solos do mundo estão degradados. Coordenado pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), o trabalho publicou seus resultados no livro “Estado da Arte do Recurso Solo no Mundo” (Status of the world´s soil resources).
O relatório traz uma perspectiva global sobre as condições atuais do solo, seu papel na prestação de serviços ecossistêmicos, como produção de água e sequestro de carbono, bem como sobre as ameaças à sua contribuição para a produção desses serviços. Segundo a pesquisadora da Embrapa Solos, Maria de Lourdes Mendonça Santos Brefin, membro do comitê editorial e coordenadora da publicação para a América Latina e Caribe, a perspectiva é de que a situação possa piorar se não houver ações concretas que envolvam indivíduos, setor privado, governos e organizações internacionais. “A principal conclusão do livro não é boa. O índice de degradação no mundo é alto e provocado principalmente por erosão, compactação, perda de matéria orgânica e desequilíbrio de nutrientes”, revela a pesquisadora.
“Essas quatro ameaças têm a mesma origem: a exploração cada vez maior da terra por parte do ser humano, geralmente combinada com as mudanças climáticas”, afirma Miguel Taboada, diretor do Departamento de Solos do argentino Instituto Nacional de Tecnologia Agropecuária (INTA).
Perdas anuais de culturas causadas por erosão foram estimadas em 0,3% da produção. Se o problema continuar nesse ritmo, uma redução total de mais de 10% poderá acontecer até 2050. A erosão em solo agrícola e de pastagem intensiva varia entre cem a mil vezes a taxa de erosão natural e o custo anual de fertilizantes para substituir os nutrientes perdidos pela erosão chega a US $ 150 bilhões.
Outro problema que ameaça o solo é sua compactação, que pode reduzir em até 60% os rendimentos mundiais das culturas agrícolas. “No mundo, a compactação tem degradado uma área estimada de 680.000 km2 de solo, ou cerca de 4% da área total de terras”, revela Lourdes, que também compôs o grupo de 27 especialistas do Painel Técnico Intergovernamental do Solo (ITPS) da Organização das Nações Unidas. O pisoteio dos rebanhos e a cobertura insuficiente do solo pela vegetação natural ou pelas culturas são responsáveis pela compactação de 280.000 km2 na África e Ásia, uma área maior do que o território da Nova Zelândia.
Os danos causados pela compactação do solo são de longa duração ou mesmo permanentes. Uma compactação que aconteça hoje pode levar à redução da produtividade das culturas até 12 anos mais tarde.
No entanto, o maior obstáculo para melhorar a produção de alimentos e as funções do solo em muitas paisagens degradadas é a falta de nutrientes, especialmente nitrogênio e fósforo, bem como insumos orgânicos. Toda a África, à exceção de três países, retira mais nutrientes do solo a cada ano do que é devolvido por meio do uso de fertilizantes, resíduos da produção, estrume e outras matérias orgânicas.
Em outras áreas, a oferta excessiva de nutrientes contamina o solo e os recursos hídricos e contribui para as emissões de gases de efeito estufa. Em 2010, as emissões de óxido nitroso dos solos agrícolas provocadas pela adição de fertilizantes sintéticos foram equivalentes a 683 milhões de toneladas de CO2.

Pesquisa e legislação são a solução

O livro não aponta só os problemas. O relatório mostra caminhos sobre como lidar com essas ameaças ao solo, tanto no âmbito de políticas públicas como trazendo recomendações técnicas.
Para interromper a degradação do solo é necessário focar em quatro pilares definidos pela União Europeia: aumento do conhecimento, pesquisa, integração da proteção do solo na legislação existente e um novo instrumento legal (lei). “Um bom exemplo de instrumento legal é o Ato de Conservação do Solo, promulgado em 1935, nos Estados Unidos”, revela o italiano Luca Montanarella, cientista do Centro Conjunto de Pesquisa da União Europeia. “O Ato reverteu a tendência negativa de erosão massiva no Meio-Oeste americano nos últimos 80 anos,” diz.
Especialistas afirmam que os instrumentos legais precisam ser reforçados pelo aumento das atividades de conscientização e educação, assim como é preciso reforçar o investimento em pesquisa e tecnologias de recuperação. Para eles, desenvolver essa estratégia pode reverter a tendência de degradação do solo no mundo e deve ser o objetivo para o manejo sustentável da terra.
“Existe evidência de que a humanidade está perto dos limites globais para fixação total de nitrogênio e os limites regionais para o uso de fósforo”, diz Maria de Lourdes. “Portanto, devemos agir para estabilizar ou reduzir o nitrogênio e uso de fósforo de fertilizantes, aumentando simultaneamente o uso de fertilizantes em regiões com deficiência de nutrientes”. De acordo com a cientista da Embrapa, aumentar a eficiência de nitrogênio e a utilização de fósforo pelas plantas é um requisito fundamental para atingir esse objetivo.

Evitar a degradação

A publicação recomenda oito técnicas para evitar a degradação do solo: minimizar o revolvimento, evitando a colheita mecanizada; aumentar e manter uma camada protetora orgânica na superfície do solo, usando grãos de cobertura e resíduos desses grãos; cultivo de uma grande variedade de espécies de plantas – anuais e perenes − em associações, sequências e rotações que podem incluir árvores, arbustos, pastos e grãos; usar espécies bem adaptadas para resistir aos estresses bióticos e abióticos e com boa qualidade nutricional, plantadas no período apropriado; aumentar a nutrição dos grãos e a função do solo, usando rotação de grãos e uso criterioso de fertilizantes; assegurar o manejo integrado de pestes, doenças e sementes usando práticas apropriadas e pesticidas de baixo risco quando necessário; gerenciamento correto do uso da água e, por último, controlar as máquinas e o tráfego nas propriedades a fim de evitar a compactação. Essas oito práticas combatem com eficiência a erosão, o desequilíbrio de nutrientes, a perda de matéria orgânica e a compactação.

Ações no Brasil

A Embrapa, ao lado do Tribunal de Contas da União (TCU), reuniu em 2012 em Brasília, autoridades brasileiras e mundiais durante três dias de debates sobre solos. Na ocasião foi elaborada a Carta de Brasília, com recomendações aos tomadores de decisão sobre o manejo e conservação da terra.
Outra importante ação estratégica é a implementação do Programa Nacional de Solos do Brasil (Pronasolos), que reúne um grupo de especialistas a fim de criar instrumentos para a governança dos solos no Brasil. O Programa é capitaneado pela Embrapa Solos atendendo a uma resolução do TCU e envolve dez centros de pesquisa da Embrapa, quatro universidades, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM) e o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).
De acordo com Maria de Lourdes Mendonça, o Pronasolos será um marco da retomada do País no conhecimento mais detalhado de seus solos. O Programa também possibilitará a construção e a gestão de uma infraestrutura de dados de solos unificada, a formação e o resgate de competências em pedologia, o fortalecimento das instituições envolvidas e uma estratégia eficiente de transferência de tecnologias. A Embrapa Solos procura parceiros privados para implantar o programa.
O documento elaborado pelos membros do projeto prevê a inclusão do Pronasolos no Plano Plurianual do Mapa, com recursos diretos por meio de uma Fundação e contratação, pela Embrapa, de equipe mínima permanente de pedólogos. O programa ainda será incluído na nova Lei de Conservação de Solos e Água.

Fonte: Embrapa

Informe da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas – FAPEAM, in EcoDebate

Pulverização aérea de agrotóxico provoca danos persistentes, dizem especialistas


Por Edwirges Nogueira


Em 2006, uma nuvem tóxica oriunda da pulverização aérea em plantações de soja chegou à área urbana e provocou intoxicação aguda em crianças e idosos de Lucas do Rio Verde (MT). Já em 2013, quase 100 pessoas, entre professores e alunos, tiveram intoxicação depois que um avião jogou defensivos agrícolas sobre uma escola de Rio Verde (GO).
O professor do Núcleo de Estudos Ambientais e Saúde do Trabalhador da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) Wanderley Pignati, que participou da perícia dos dois casos, acredita que a poluição causada por agrotóxicos pode ser considerada intencional, uma vez que, para atingir o alvo, afeta também o solo e a água.
“Não é acidente. O avião passa ao lado e, de qualquer jeito, o vento vai levar para um lado ou para outro. Essa história de que o vento não leva o veneno para outro lugar fere os princípios da aviação, inclusive, pois se o vento estiver parado, o avião nem levanta voo”, disse o especialista durante uma palestra na Assembleia Legislativa do Ceará, em Fortaleza, em maio deste ano.
Um dos principais argumentos contra a pulverização aérea é a chamada deriva, quando a aplicação de defensivo agrícola não atinge o local desejado e se espalha para outras áreas. O pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Aldemir Chaim, no artigo Tecnologia de aplicação de agrotóxicos, de 2004, declara que a aplicação de agrotóxicos no século atual não é muito diferente da forma como era praticada no século passado. A principal característica dessa aplicação é o desperdício de produto químico.
Em 1999, Chaim e outros pesquisadores desenvolveram uma forma de quantificar esse desperdício em diferentes formas de aplicação de agrotóxicos. Dependendo da altura das plantas, apenas metade do produto aplicado atinge o alvo. O restante cai no solo ou se perde pela deriva. Em 2013, a Embrapa desenvolveu o Programa Gotas, um software que ajuda na calibração das pulverizações.
Segundo Pignati, no caso da pulverização aérea, a deriva pode atingir áreas mais distantes devido ao espaço entre o alvo e o avião: quanto mais alto a aeronave estiver da lavoura que receberá os defensivos, maior será a deriva por conta da ação do vento.
A professora do Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC) Raquel Rigotto participou de um estudo que identificou princípios ativos de agrotóxicos no solo da região da Chapada do Apodi – uma das áreas mais ocupadas pelo agronegócio no Ceará. Segundo a especialista, as substâncias encontradas – difenoconazol e epoxiconazol – são muito tóxicas: o difenoconazol, por exemplo, pode comprometer seriamente o fígado e é tido como possível causador de câncer, segundo classificação da Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA, na sigla em inglês).
A especialista acredita que as substâncias podem chegar até mesmo às cisternas que abastecem as casas durante a seca.Também foram encontrados princípios ativos de agrotóxicos no aquífero Jandaíra, localizado entre o Ceará e o Rio Grande do Norte. As águas subterrâneas são usadas tanto pelo setor produtivo como pelas populações dos oito municípios cearenses, incluindo Limoeiro do Norte, e potiguares que abrangem o aquífero.
“Esses contaminantes são transportados pelo vento, podem se depositar no telhado das casas e, quando vem a chuva, ela lava os telhados e é essa a água que as calhas recolhe e se dirige para as cisternas. Temos uma preocupação muito grande se essas águas, que muitas vezes garantem o abastecimento hídrico das famílias nos períodos de seca, podem também estar contaminadas com esses produtos”, indaga Raquel.

Fonte: EcoDebate