sábado, 27 de novembro de 2010

A gestão do lixo requer uma gestão compartilhada

Por Jetro Menezes*, da Plurale



Segundo o Manual de Gerenciamento Integrado – Lixo Urbano (2010), publicado pelo Cempre (Compromisso Empresarial para a Reciclagem), “estima-se que a população mundial está acima de 6,6 bilhões de habitantes e a quantidade de lixo gerado transita entre 2 e 3 bilhões de toneladas por ano.” Desta forma, podemos considerar que o lixo gerado no mundo – incluindo o Brasil - é um verdadeiro mosaico e, por isso, torna-se cada vez mais necessário o planejamento de todas as etapas da geração do lixo.

Conforme a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), as etapas que envolvem a vida útil do lixo começam na fabricação, passam pela comercialização para o consumidor final, até o destino e a disposição final ambientalmente adequada. Os destinos do lixo são variados: o aterro sanitário, a coleta seletiva, a reciclagem, a reutilização, a incineração, o reaproveitamento em fornos ou asfalto, co-processamento, artesanato, a compostagem dos orgânicos ou outras formas de tratamento regulamentadas pelos órgãos ambientais. Mas antes de planejar as ações de gerenciamento de todo o lixo gerado numa cidade, seja em uma grande empresa, um comércio de pequeno ou médio porte, uma escola, um condomínio residencial ou comercial é necessário conhecer o lixo por meio de um diagnóstico da realidade local.

A análise do lixo da cidade permite identificar as formas de tratamento mais adequadas para cada um deles e, assim, planejar as ações do presente e do futuro. Esse trabalho começa com a elaboração de um questionário que aborda questões fundamentais, como: aspectos legais (legislação existente); relação do lixo com as águas do município; funcionamento do serviço de limpeza urbana e coleta do lixo; existência ou não de uma estação de transferência (transbordo); destino e quantidade do lixo municipal; tipos de lixo que existem na cidade; a existência ou não de um cadastro de catadores e de coleta seletiva; registro dos bairros onde há coleta de lixo; identificação dos serviços que acarretam em despesa orçamentária para a prefeitura; e a previsão sobre a situação futura para as questões de limpeza urbana, entre outras questões.

Para se ter uma idéia, o lixo gerado numa residência é o mesmo lixo de uma indústria, o que vai diferenciar é a quantidade. Numa residência são gerados resíduos orgânicos (sobras de alimento, cascas de frutas e legumes, madeiras, gramas, podas de árvores), óleo de cozinha, recicláveis (papéis, todos os tipos de plásticos, vidros e metais), sanitários, resíduo de saúde, pneus, pilhas e baterias (de celular e automóvel), microcomputadores obsoletos, lâmpadas de todas as espécies, celular “ultrapassado”, roupas e sapatos velhos, óleos lubrificantes, solventes, tintas, latas em geral, isopor, entulho e até móveis. Na indústria, além de todos os citados acima, ainda encontramos outros óleos lubrificantes (máquinas, transporte em geral), resíduos do processo de fabricação e demais subprodutos, elementos químicos e radioativos, lodos (lavagem dos veículos, pintura) que devem ser encaminhados para os locais adequados. O esgoto da indústria também não escapa dessa listagem e deve ser tratado.

Aí está o desafio para todos os geradores de lixo: planejar adequadamente todas as etapas da vida dos resíduos por meio de uma visão compartilhada. Esse planejamento deve partir do poder local, ou seja, das prefeituras, que deverão ouvir a sociedade civil e o setor privado. Falando mais diretamente, a lição de casa para todas as prefeituras brasileiras é: a elaboração de mecanismos adequados para a implantação do seu respectivo Plano de Gerenciamento Integrado dos Resíduos Sólidos, em parceria com todos os geradores de resíduos sólidos. A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) convoca todos para a elaboração do plano de gestão integrada do lixo, preferencialmente compartilhada pelo poder local, setor privado e sociedade civil. A partir desse diálogo, surgirão as regras e normas (leis e decretos municipais), os convênios e acordos setoriais, as parcerias público-privadas (PPP), a informação para a sociedade, a formação profissional dos servidores municipais, a comunicação interna e externa, a educação ambiental formal e informal e a fiscalização efetiva (com orientação e punição). Parece uma utopia, mas será possível com a contribuição de todos os geradores de lixo.

*Jetro Menezes é Colunista de Plurale, colaborando com artigos sobre Sustentabiilidade. É consultor e gestor ambiental e diretor de Meio Ambiente da Prefeitura de Franco da Rocha (SP)



Fonte: Envolverde

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

O negócio da água potável

mundo está começando lentamente a entender que estamos em meio a uma séria crise da água em nível planetário e, portanto, da saúde pública. Atualmente, 884 milhões de pessoas não têm acesso ao fornecimento seguro de água doce, enquanto a ONU estima que até 2030 mais da metade da população mundial viverá em áreas com alto risco de escassez.

Não surpreende que o mundo empresarial esteja cada vez mais consciente de que a crescente demanda está criando um futuro incerto. A água agora se converteu em um grande negócio. Existe uma interligação entre o acesso das pessoas a água, as empresas com interesse particular na água e as que centram sua atenção nos mercados emergentes.

Os negócios dependentes do uso da água em operações diretas e por meio de redes de fornecimento – em particular às companhias multinacionais – estão reconhecendo de maneira crescente os riscos políticos, sociais, econômicos e ambientais vinculados à água. Em última instância, se as pessoas não tiverem acesso a água devido às atividades de uma empresa, coloca-se em risco sua reputação e sua autorização para operar.

De fato, vimos uma proliferação de campanhas relacionadas com a água que algumas das principais firmas do setor realizam. Estas campanhas têm temas comuns: destacam o trabalho que as empresas realizam para minimizar a quantidade de água utilizada na produção e baixar o nível de contaminação provocado pelos processos industriais, e anunciam em alto e bom som que estão gastando dinheiro para garantir que mais pessoas tenham acesso a um fornecimento seguro.

Os compromissos assumidos por estas empresas merecem aplauso. Porém, diante da crua realidade de que quase um bilhão de pessoas vivem sem água segura, é claro que os empresários devem rever seus planos e suas atividades com a utilização deste recurso.

As campanhas não são suficientes. O setor privado, os governos e a sociedade civil devem ampliar seus esforços para garantir que os mais pobres do mundo tenham um acesso justo a água. O impacto da escassez de água nos países em desenvolvimento é imenso, particularmente nas áreas de saúde infantil, educação das meninas, e bem-estar e sustento das mulheres.

Nas áreas urbanas as mulheres podem passar horas em filas para conseguir água em uma torneira pública ou se veem diante da necessidade de obter água contaminada ou de vendedores, que cobram altos preços, ou de outras fontes duvidosas. Frequentemente suja e insegura, essa água pode ser letal.

Este ano, uma análise da revista The Lance aponta a diarreia como o maior assassino de crianças na África subsaariana; 90% dos casos de diarreia são causados por água insegura e pobres instalações sanitárias, e matam mais crianças do que a aids, o sarampo e a malária juntos.

Com tais consequências fatais, não é, absolutamente, suficiente as empresas assumirem a questão por meio de sistemas de manejo razoável do recurso (que deveria ser uma prática padrão) ou que invistam em esquemas de fornecimento de água para a comunidade acreditando que com isso cumprem suas responsabilidades. A situação exige que as empresas, os doadores, as organizações da sociedade civil e os governos se unam para enfrentar e mitigar os riscos compartilhados.

Existem muitos obstáculos que impedem uma visão de um mundo onde todos tenham acesso a água e a instalações sanitárias. Essas obstruções vão desde os fracassados reguladores e a falta de aplicação das leis, de problemas de capacidade e recursos, de coordenações ineficientes no financiamento, até a carência de dados disponíveis e confiáveis sobre as bacias hidrográficas.

Estas questões apresentam desafios para as companhias que pretendem conservar autorização legal e social para funcionar. E também – o que é mais importante – criam crescentes dificuldades para os setores mais pobres do mundo.

Somente com a ampliação de seu enfoque e uma abordagem ativa dos problemas nas áreas de risco compartilhado, por meio de proposições cooperativas e integradas, as empresas poderão ter capacidade de dar, verdadeiramente, uma contribuição duradoura para enfrentar a crise mundial da água. Envolverde/IPS

* Duncan Wilbur é um dirigente da WaterAid, organização não governamental dedicada a conseguir acesso a água limpa e saneamento adequado (http://www.wateraid.org).

Este artigo é parte de uma série de artigos e entrevistas sobre a responsabilidade social e ambiental das empresas patrocinada por Anheuser-Busch InBev.



Fonte: Envolverde/IPS

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Método torna solução de formol adequada para descarte em esgoto

Por Valéria Dias, da Agência USP

Pesquisadores do campus de Ribeirão Preto da USP desenvolveram um método que permite que a solução de formaldeído ou formol — usada para conservar peças anatômicas e corpos embalsamados — seja despejada em esgoto comum sem causar danos ao meio ambiente. O tratamento, realizado por meio de um reator anaeróbio horizontal de leito fixo, reduz a concentração de formol em 70%, tornando-o adequado para descarte no esgoto comum.

O projeto foi desenvolvido pela professora Sonia Valle Walter Borges de Oliveira, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto (FEARP) da USP. “Estamos realizando outros estudos visando o aumento do teor de redução do formol até chegar a cerca de 90%”, informa a pesquisadora.

Sonia explica que o formol é uma substância muito forte, capaz de matar qualquer sistema biológico e, por isso, é muito utilizada para conservação de tecidos, órgãos, peças anatômicas e corpos usados em aulas de anatomia, patologia e outros estudos. “Para ser utilizado na conservação das peças, o formaldeído é diluído em água, ficando numa concentração entre 8% a 10%. Mas mesmo com essa diluição em água, ele continua altamente poluente e não deve ser descartado no esgoto comum, pois pode prejudicar sistemas de tratamento biológicos, além do risco de contaminar o solo e o lençol freático, no caso de vazamentos”, esclarece. Outro ponto é que trata-se de uma substância que pode causar câncer em humanos.

A professora conta que em seu mestrado, defendido em 2001 na Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) da USP, ela havia estudado o tratamento biológico de formaldeído. Por conta deste trabalho, ela foi convidada, no final de 2003, para participar da reforma da estrutura de esgotos dos laboratórios que utilizam formol no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP (HCFMRP). Um destes laboratórios é a Sala de Cubas, local onde peças anatômicas (membros e órgãos) são armazenadas em formol.

De acordo com Sonia, cada vez que uma peça precisa ser utilizada em aula, é necessário que ela fique embaixo de uma torneira com água corrente jorrando 24 horas consecutivas para ser lavada a fim de retirar o excesso de formol. Caso contrário, a toxicidade impediria que as pessoas se aproximassem da peça. Mesmo com essa lavagem ininterrupta durante um dia inteiro, os odores são muito fortes, e pode haver irritação dos olhos, por exemplo. Esse líquido era encaminhado para o esgoto comum.

O convite para participar da reforma dos laboratórios visava exatamente dar um fim adequado aos resíduos provenientes da lavagem de peças e também da substituição do líquido que as conserva. “O formol é muito volátil. Com o abre e fecha dos recipientes onde ficam guardadas as peças e necessidade de lavagem, havia um descarte contínuo da substância na rede de esgoto”, explica. Além disso, pode ocorrer o aparecimento de fungos sendo preciso descartar as peças, corpos e o líquido. “A reposição de corpos e peças é bastante difícil; por isso é necessário garantir uma conservação adequada”, completa.

Lodo aplicado na espuma contêm microorganismos que degradam o líquido com solução de formaldeído

Reator anaeróbio

A professora desenvolveu o projeto a partir de uma série de estudos sobre a realidade dos laboratórios, como a vazão diária de líquido residuário. O reator ficou pronto no final de 2008, ao custo de R$45 mil. Foi construída uma estrutura com 10 reatores, cada um deles medindo três metros de extensão com 30 centímetros de diâmetro.

O efluente dos laboratórios é diluído na água de lavagem das peças, ficando armazenado em um tanque (chamado de equalização). Um sistema de bombeamento automático leva o líquido até cada reator, do primeiro até o décimo, processo que dura cerca de 9 horas (tempo de detenção hidráulica) para finalizar o tratamento. Diferentes tipos de microorganismos, em cada um dos reatores, se encarregam de degradar o líquido. Uma vez por semana são adicionados no tanque de equalização alguns suplementos para esses microorganismos, como metais traço (ferro e níquel) e sais minerais, além de uma solução com bicarbonato de sódio para manter a alcalinidade.

Cada reator mede três metros de extensão por 30 centímetros de diâmetro

O resultado final é a remoção de 70% do formol do líquido que sai do último reator. “Estamos realizando outros estudos para ajustar o tempo de detenção hidráulica a fim de conseguir chegar a uma porcentagem maior de remoção do formol”, aponta.

De acordo com a professora, em relação aos efluentes contendo formaldeído, a orientação é que o próprio gerador do resíduo deverá ser responsável pelo seu tratamento. “Existem inúmeros hospitais e faculdades pelo Brasil que utilizam o formol de alguma maneira, porém o descarte nem sempre é feito corretamente”, comenta a professora, que desconhece a existência de iniciativas semelhantes implantadas em outras universidades.

Fonte: Envolverde/Agência USP de Notícias