Por Valéria Dias, da Agência USP
Pesquisadores do campus de Ribeirão Preto da USP desenvolveram um método que permite que a solução de formaldeído ou formol — usada para conservar peças anatômicas e corpos embalsamados — seja despejada em esgoto comum sem causar danos ao meio ambiente. O tratamento, realizado por meio de um reator anaeróbio horizontal de leito fixo, reduz a concentração de formol em 70%, tornando-o adequado para descarte no esgoto comum.
O projeto foi desenvolvido pela professora Sonia Valle Walter Borges de Oliveira, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto (FEARP) da USP. “Estamos realizando outros estudos visando o aumento do teor de redução do formol até chegar a cerca de 90%”, informa a pesquisadora.
Sonia explica que o formol é uma substância muito forte, capaz de matar qualquer sistema biológico e, por isso, é muito utilizada para conservação de tecidos, órgãos, peças anatômicas e corpos usados em aulas de anatomia, patologia e outros estudos. “Para ser utilizado na conservação das peças, o formaldeído é diluído em água, ficando numa concentração entre 8% a 10%. Mas mesmo com essa diluição em água, ele continua altamente poluente e não deve ser descartado no esgoto comum, pois pode prejudicar sistemas de tratamento biológicos, além do risco de contaminar o solo e o lençol freático, no caso de vazamentos”, esclarece. Outro ponto é que trata-se de uma substância que pode causar câncer em humanos.
A professora conta que em seu mestrado, defendido em 2001 na Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) da USP, ela havia estudado o tratamento biológico de formaldeído. Por conta deste trabalho, ela foi convidada, no final de 2003, para participar da reforma da estrutura de esgotos dos laboratórios que utilizam formol no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP (HCFMRP). Um destes laboratórios é a Sala de Cubas, local onde peças anatômicas (membros e órgãos) são armazenadas em formol.
De acordo com Sonia, cada vez que uma peça precisa ser utilizada em aula, é necessário que ela fique embaixo de uma torneira com água corrente jorrando 24 horas consecutivas para ser lavada a fim de retirar o excesso de formol. Caso contrário, a toxicidade impediria que as pessoas se aproximassem da peça. Mesmo com essa lavagem ininterrupta durante um dia inteiro, os odores são muito fortes, e pode haver irritação dos olhos, por exemplo. Esse líquido era encaminhado para o esgoto comum.
O convite para participar da reforma dos laboratórios visava exatamente dar um fim adequado aos resíduos provenientes da lavagem de peças e também da substituição do líquido que as conserva. “O formol é muito volátil. Com o abre e fecha dos recipientes onde ficam guardadas as peças e necessidade de lavagem, havia um descarte contínuo da substância na rede de esgoto”, explica. Além disso, pode ocorrer o aparecimento de fungos sendo preciso descartar as peças, corpos e o líquido. “A reposição de corpos e peças é bastante difícil; por isso é necessário garantir uma conservação adequada”, completa.
Lodo aplicado na espuma contêm microorganismos que degradam o líquido com solução de formaldeído
Reator anaeróbio
A professora desenvolveu o projeto a partir de uma série de estudos sobre a realidade dos laboratórios, como a vazão diária de líquido residuário. O reator ficou pronto no final de 2008, ao custo de R$45 mil. Foi construída uma estrutura com 10 reatores, cada um deles medindo três metros de extensão com 30 centímetros de diâmetro.
O efluente dos laboratórios é diluído na água de lavagem das peças, ficando armazenado em um tanque (chamado de equalização). Um sistema de bombeamento automático leva o líquido até cada reator, do primeiro até o décimo, processo que dura cerca de 9 horas (tempo de detenção hidráulica) para finalizar o tratamento. Diferentes tipos de microorganismos, em cada um dos reatores, se encarregam de degradar o líquido. Uma vez por semana são adicionados no tanque de equalização alguns suplementos para esses microorganismos, como metais traço (ferro e níquel) e sais minerais, além de uma solução com bicarbonato de sódio para manter a alcalinidade.
Cada reator mede três metros de extensão por 30 centímetros de diâmetro
O resultado final é a remoção de 70% do formol do líquido que sai do último reator. “Estamos realizando outros estudos para ajustar o tempo de detenção hidráulica a fim de conseguir chegar a uma porcentagem maior de remoção do formol”, aponta.
De acordo com a professora, em relação aos efluentes contendo formaldeído, a orientação é que o próprio gerador do resíduo deverá ser responsável pelo seu tratamento. “Existem inúmeros hospitais e faculdades pelo Brasil que utilizam o formol de alguma maneira, porém o descarte nem sempre é feito corretamente”, comenta a professora, que desconhece a existência de iniciativas semelhantes implantadas em outras universidades.
Fonte: Envolverde/Agência USP de Notícias
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