segunda-feira, 25 de junho de 2012

O legado de avanços e retrocessos da RIO+20

Por Vanessa Barbosa/Exame.com


Com um nome que promete mais do que entrega, a declaração final da Rio+20, intitulada “O Futuro que queremos”, foi assinada nesta sexta-feira pelos chefes de Estado e de governo da ONU. O documento de 53 páginas reafirma compromissos assumidos na Rio92 e em Cúpulas anteriores e prevê a criação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, um conjunto de ações a serem implementadas a partir de 2015, que vão desde a erradicação da pobreza ao aumento da oferta de energia limpa para todos. No entanto, faltou definir exatamente quais serão esses objetivos e como eles serão colocados em prática.

O texto, publicado no site oficial da conferência, também peca por compromissos pouco ambiciosos, marcados por muitas intenções e propostas mínimas de soluções concretas. Para a presidente Dilma Rousseff, a declaração “ é um ponto de partida, e não de chegada”, sugerindo que os países devem refinar seus esforços pelo desenvolvimento sustentável daqui para frente.

Em contrapartida, acordos promissores sugiram da sociedade civil em eventos paralelos à Rio+20 nesses últimos dez dias. Confira a seguir, avanços e retrocessos da Conferência da ONU pelo Desenvolvimento Sustentável:

Os avanços:

MUITO ALÉM DO PIB

Há tempos se discute a criação de uma nova métrica para medir as riquezas das nações em substituição ao PIB, considerado por muitos como insuficiente para dar conta da complexidade dos desafios do desenvolvimento sustentável. Em abril, o próprio Secretário-Geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, disse que por não incorporar avaliações dos custos ambientais e sociais, o indicador é insuficiente para medir o grau de desenvolvimento sustentável dos países e que os resultados finais da Rio+20 deveriam trazer novos parâmetros de medição.

E não é que isso aconteceu? O Índice Inclusivo de Riqueza foi mostrado pelo Programa Internacional de Dimensões Humanas das Mudanças Ambientais Globais (UNU-IHDP, na sigla em inglês) e pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) durante a Conferência. No cálculo do PIB verde, como vem sendo chamado, entra a “riqueza inclusiva” da nações, incluindo aí fatores como bem-estar social e o capital natural – como florestas, qualidade do ar, recursos hídricos, combustíveis fósseis, solo. Foram analisados os desempenhos de 20 países que somam 56% da população e mais de três quartos do PIB mundial, no período de 1990 a 2008. Segundo esse índice, o Brasil é quinto colocado na média de melhor crescimento com sustentabilidade. Mesmo assim, o país perdeu 25% dos seus recursos naturais em 19 anos.

MEGACIDADES DECLARAM METAS AMBICIOSAS

Enquanto os governos nacionais têm tido dificuldades em chegar a um acordo global para reduzir emissões e combater o aquecimento global, um grupo de prefeitos das maiores cidades do mundo, o C40, lançou metas ambientais ambiciosas durante evento paralelo à Rio+20. Sob coordenação do prefeito de Nova York, Michael Bloomberg, eles fecharam um acordo para reduzir a emissão de gases que provocam o efeito estufa em quantidade equivalente ao que é emitido pelo México durante todo o ano.

Para atingir esse objetivo, as megacidades precisarão implementar soluções para problemas comuns dos grandes centros urbanos, como o trânsito, o lixo (grande emissor de gás metano), infraestrutura falha, entre outros. Para atingir esses objetivos, os prefeitos podem recorrer a um fundo de cerca de R$ 13 bilhões por ano do Banco Mundial.

RECONHECENDO O VALOR DO CAPITAL NATURAL

O Banco Mundial anunciou em parceria com 57 países, a Comissão Europeia e 86 grandes empresas globais a implementação da “contabilidade do capital natural”. Outro avanço na inclusão dos recursos naturais na conta ambiental e financeira das empresas foi o lançamento do maior sistema de reporte de capital natural do planeta, que integra, numa mesma plataforma, a gestão da água, do carbono e das florestas, feito pelo CDP em conjunto com o Global Canopy Programme (GCP). “Tanto os investidores quanto as empresas estão cada vez mais conscientes de que é necessário acessar todas as implicações do nosso capital natural porque suas cadeias de valor são influenciadas pelas limitações de recursos naturais”, afirmou à EXAME.com, Paul Simpson, CEO do Carbon Diclosure Program, maior banco de dados do mundo sobre ações climáticas empresariais.

ECONOMIA VERDE PARA TODOS OS GOSTOS

Ponto polêmico nas negociações, a definição da economia verde se mostrou tão diversa quanto os desafios ambientais, sociais e econômicos dos mais de 190 países representados na Conferência. Grosso modo, as nações mais ricas simpatizam com o lado da produção verde, baseada em tecnologias mais limpas e inovação, para garantir um crescimento econômico sustentável. Enquanto para muitos países pobres, a economia verde deve estar a serviço do desenvolvimento sustentável, ajudando a sanar de uma vez por todas as máculas profundas da desigualdade social, através da erradicação da pobreza extrema, melhoria das condições de vida e acesso justo aos recursos básicos para sobrevivência, como água, ar limpo e alimentos. A boa notícia é que a Declaração final da Rio+20, deixa a cada país decidir sobre a definição que melhor atenda às suas necessidades, reconhecendo a economia verde como uma das ferramentas importantes para avançar rumo ao desenvolvimento sustentável, sem “ “impor regras rígidas” nem desrespeitar a soberania nacional de cada país.

Os retrocessos:

MUITAS INTENÇÕES, POUCAS AÇÕES

Não faltam boas intenções ao longo das 53 páginas do Declaração Final da Rio+20, chamada “O Futuro que queremos”. É de perder a conta o número de frases acompanhadas de expressões como “encorajaremos” e “apoiaremos”. Falta no entanto a assertividade de outros verbos, do tipo “faremos” e “implementaremos”, que demonstram mais compromisso político em viabilizar de fato o desenvolvimento sustentável.

FUNDO VERDE FICOU PARA 2014

É consenso entre os países que participaram da Conferência que as nações mais pobres precisam de ajuda financeira para implementar soluções para o seu desenvolvimento sustentável. A discórdia se instala na hora de pagar essa conta. Como todo mundo tira o corpo fora, principalmente as nações mais ricas, foi por água abaixo na Rio+20 uma das propostas mais esperadas para sair do encontro – a criação de um fundo verde, que segundo os países do G77 (grupo em desenvolvimento) deveria garantir 30 bilhões de dólares. A ideia foi rejeitada pelos Estados Unidos, União Europeia, Canadá e Japão. O texto final prevê apena a formação de uma comissão especial para desenhar um fundo verde até 2014.

OCEANOS À DERIVA

A proteção da biodiversidade em alto-mar era para a ONU um assunto prioritário e que devia constar de forma consensual no texto final da Rio+20. O desafio era chegar a um consenso sobre a proteção das áreas além-mar que estão fora de jurisdições nacionais dos países. No entanto, o texto fina não contempla essas áreas e registra apenas a preocupação dos países com a preservação dos oceanos de forma genérica. A lista de ameaças aos oceanos e à vida marinha vai da poluição e pesca excessiva (industrial e ilegal) à acidificação causada pelo aquecimento global.

FORTALECIMENTO DO PNUMA

Reforçar a capacidade de governança ambiental internacional era um dos resultados mais esperados da Rio+20. Mas o texto final não tranformou o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, o Pnuma, numa entidade com mais verba e poder similares aos desfrutados por outras organizações, como a (FAO), comércio (OMC), educação e cultura (Unesco). Diferente das entidades citadas, o Pnuma não tem a força nem a autoridade necessárias para fazer valer os acordos ambientais assinados internacionalmente todos os anos, que na prática deixam muito a desejar.

Fonte: Planeta Sustentável



quarta-feira, 20 de junho de 2012

Falta de estratégia de gestão da água ameaça agravar conflitos provocados pela escassez de recursos hídricos




Disputa pela água tende a aumentar – A falta de uma estratégia de gestão da água ameaça agravar os conflitos provocados pela escassez de recursos hídricos no país. O alerta foi feito no seminário “A Governança da Água”, no primeiro dia do fórum Humanidade 2012, evento paralelo da Rio+20 promovido pelas federações das indústrias de São Paulo (Fiesp) e do Rio de Janeiro (Firjan) no Forte de Copacabana, na Zona Sul do Rio. O encontro reuniu empresários, ambientalistas, acadêmicos e administradores de empresas de abastecimento e saneamento. Matéria de Paulo Vasconcellos , no Valor Econômico, socializada pelo ClippingMP.

“Embora o Brasil ainda não tenha grandes conflitos de disputa pela água, os atritos já começam a aparecer. A tendência é que se agravem se a gestão dos recursos hídricos não for adequada”, disse Vicente Andreu Guillo, presidente da Agência Nacional de Águas (ANA).

O Brasil tem hoje pelo menos três áreas sensíveis de escassez de água. A mais grave é a do semiárido do Nordeste, atingido pela pior seca em quatro décadas. Parte do Rio Grande do Sul também sofre com a estiagem. O terceiro foco é o rio São Marcos, localizado entre Minas Gerais e Goiás, porque a irrigação está desviando para a lavoura a água que deveria chegar às usinas para a geração de energia.

“A fragmentação atrapalha a gestão dos recursos para abastecimento e saneamento. A falta de estratégia faz com que se leve mais tempo para resolver os conflitos em torno da água”, afirmou João Gilberto Lotufo Conejo, diretor da agência, que também participou do seminário.

Além da falta de visão estratégica, a governança dos recursos hídricos precisa enfrentar um desafio urgente: a necessidade de investimentos de R$ 22,2 bilhões até 2025 na modernização dos sistemas de captação, tratamento e distribuição.

De acordo com dados do “Atlas do Abastecimento Urbano”, da agência nacional, mais da metade dos municípios brasileiros terá dificuldade em manter o abastecimento de água à população daqui a treze anos. Nove por cento terão que construir novas barragens e estações de tratamento.

A maior fatia dos investimentos, R$ 9,1 bilhões, deverá ser direcionada à região Nordeste porque barragens e açudes não dão mais conta das necessidades de abastecimento da população e da irrigação das áreas agrícolas.

O Sudeste precisa de R$ 7,4 bilhões de investimentos para fazer frente ao crescimento populacional. As regiões Sul e Norte necessitam de R$ 2 bilhões cada uma e o Centro-Oeste do país, de mais R$ 1,7 bilhão.

É preciso aprimorar ainda os mecanismos de proteção aos recursos hídricos. O presidente da Agência Nacional da Água defendeu que a economia que poderá ser feita com a renegociação dos contratos de concessão de energia, que estão para vencer, não seja direcionada apenas para a redução das tarifas ao consumidor. Parte poderia ser convertida para um fundo visando projetos de reflorestamento das margens de rios e programas de proteção das bacias hidrográficas brasileiras.

Entre as concessões que terão de ser renovadas em breve estão as da Companhia Hidrelétrica do Rio São Francisco (Chesf), no Nordeste, da Companhia Energética de São Paulo (Cesp) e de Furnas Centrais Elétricas, que atende as regiões Sudeste, Sul, Centro-Oeste e Norte. As concessionárias, de acordo com o presidente da ANA, movimentam R$ 6 bilhões por ano.

“Com R$ 100 milhões por ano, que é uma parte pequena em relação aos valores das concessões, dá para proteger 100 mil quilômetros de margens de rios”, afirmou Vicente Andreu Guillo.

O debate no fórum Humanidade 2012 serviu para a apresentação de propostas que convergem para um ponto em comum: a necessidade de se fortalecer a importância da água nas discussões ambientais.

Até agora, concordam ambientalistas, gestores públicos e representantes de entidades empresariais, ela foi relegada a um papel acessório. Uma das ideias é a de se criar um organismo na Organização das Nações Unidas (ONU) para tratar do tema de forma global.

“O grande desafio do Brasil é saneamento, saneamento e saneamento”, disse Marilene Ramos, presidente do Instituto Estadual de Ambiente do Rio de Janeiro (Inea). Depois de pôr em dúvida os números do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que apontam que 90% dos brasileiros têm acesso à água potável e 70% são atendidos pela rede de esgoto, Marilene atacou a timidez dos avanços na gestão da água em termos de investimentos, agilidade e regulação. E citou o caso do Rio de Janeiro, um dos poucos estados brasileiros que cobram taxa de água, arrecadando cerca de R$ 40 milhões por ano com o tributo, mas ainda enfrenta muitas dificuldades na hora de aplicar os recursos. “O país precisa de um programa nos moldes do Minha Casa Minha Vida para o setor de saneamento.”

Já a representante nacional da The Nature Conservancy (TNC), Ana Cristina Barros, propôs no seminário a criação de um fundo de incentivo aos produtores agrícolas para que eles preservem ou recuperem as florestas nas margens dos mananciais hídricos como forma de garantir a produção de água.

O modelo mais bem-sucedido da proposta foi implantado em Quito, no Equador, mas o sucesso poderia ser ainda maior no Brasil porque o país é mais avançado em termos de legislação sobre os recursos hídricos.

“O cenário no Brasil está pronto. Só aqui existe este arcabouço legal, com agências e comitês de água estaduais e municipais”, disse Ana.


Fonte: EcoDebate



segunda-feira, 18 de junho de 2012

Brasileiro consome cinco quilos de agrotóxicos por ano, mostra estudo divulgado na cúpula dos povos

Por Gabriela Campelo


A venda de agrotóxicos no Brasil em 2010 teve um aumento de 190% em comparação a 2009. Isso significa que cada brasileiro consome cerca de cinco quilos de venenos agrícolas por ano. Os dados fazem parte de um estudo da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), baseado em informações disponibilizadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O estudo foi apresentado sábado, 16, na Cúpula dos Povos pela médica sanitarista Lia Giraldo da Silva Augusto, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

Ela credita o aumento na venda dos agrotóxicos ao bom momento do mercado agrícola, puxado principalmente por uma forte demanda chinesa. O produto que mais recebe venenos é a soja transgênica, que precisa do glifosato para produzir, em um tipo de “venda casada”, explicou a pesquisadora.

“Este ano a Abrasco decidiu construir um dossiê sobre o tema do agrotóxico e os impactos na saúde e no meio ambiente. O trabalho marca os 40 anos de Estocolmo [primeira conferência das Nações Unidas sobre o meio ambiente], os 20 anos da Eco92 e os 50 anos do lançamento do livro Primavera Silenciosa, de Rachel Carson.”

Segundo a médica, o uso de agrotóxicos no Brasil faz parte do modelo produtivo adotado na agricultura nacional. “Este modelo da agroindústria é todo sustentado no pacote da revolução verde, que é baseada em uma agricultura químico-dependente. O agrotóxico é parte desse modelo. Por causa disso, desde 2008 o Brasil ocupa o primeiro lugar no consumo de agrotóxicos, segundo dados levantados pela Abrasco na Anvisa.”

Fonte: Ambiental Sustentável/Uol


sexta-feira, 15 de junho de 2012

Povos resilientes e Planeta resiliente



A ONU lançou, em maio de 2012, a versão em português do relatório do Painel de Alto Nível sobre Sustentabilidade Global intitulado “Povos Resilientes, Planeta Resiliente: um Futuro Digno de Escolha”, com 56 recomendações para que o mundo avance em direção ao desenvolvimento sustentável. O documento, elaborado por 22 renomados especialistas, traz sugestões para serem debatidas com a sociedade civil e com as autoridades governamentais durante a Rio+20.

Logo no inicio o relatório diz: “Elaboramos este relatório durante um período de volatilidade e incerteza global. As economias estão oscilando. A desigualdade está crescendo. Com 7 bilhões vivendo atualmente em nosso planeta, é tempo de refletirmos sobre a nossa trajetória atual. Hoje estamos em uma encruzilhada (p. 1).

O relatório mostra que os objetivos de longo prazo do Painel de Alto Nível sobre Sustentabilidade Global são erradicar a pobreza, reduzir a desigualdade e fazer que o crescimento seja inclusivo e a produção e o consumo sejam mais sustentáveis, ao combater a mudança climática e respeitar os limites planetários. Parafraseando Charles Dickens, o relatório diz: “O nosso planeta e o nosso mundo estão vivendo hoje o melhor dos tempos e o pior dos tempos. O mundo vive uma prosperidade inédita, enquanto o planeta está sob uma pressão sem precedentes” (p. 17). O documento fala da necessidade de integrar as dimensões econômica, social e ambiental do desenvolvimento sustentável, argumentando que a humanidade não é vítima passiva de forças deterministas e que pode escolher seu futuro.

O relatório considera que para se preparar para o futuro é preciso compreender as dimensões do desafio: “Devemos reconhecer que as causas desse desafio incluem os estilos de vida e padrões de produção e consumo insustentáveis, bem como o impacto do crescimento populacional. À medida que a população global aumentará de 7 para quase 9 bilhões até 2040 e o número de consumidores da classe média aumente em 3 bilhões nos próximos 20 anos, a demanda por recursos aumentará de forma exponencial. Até 2030, o mundo precisará de no mínimo 50% mais alimentos, 45% mais energia e 30% mais água – tudo em um momento no qual os limites ambientais estão impondo novos limites ao suprimento. Isto vale também para a mudança climática, que afeta todos os aspectos da saúde humana e planetária” (p. 18).

Existem diversas pessoas que consideram ser impossível conciliar o desenvolvimento econômico com a proteção ambiental, questionando se a própria idéia de desenvolvimento sustentável seria viável ou inviável. Neste sentido, o relatório não aborda as limitações do modelo hegemônico de produção e consumo no mundo e nem as limitações das negociações internacionais da ONU, no quadro das soberanias nacionais. Dá muita ênfase ao Estado e ao mercado e pouca ênfase à sociedade civil. O relatório também não trata dos direitos dos animais e aborda as questões demográficas e os direitos de cidadania de maneira superficial. Porém, não deixa de ter validade se listar as 56 recomendações do relatório “Povos Resilientes, Planeta Resiliente: um Futuro Digno de Escolha”, conforme apresentado em seguida:

1) Governos e doadores internacionais devem aumentar seus esforços para atingir os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio para erradicar a pobreza e reduzir as desigualdades como as principais prioridades para atingir o desenvolvimento sustentável;

2) Os governos devem respeitar, proteger e garantir os direitos humanos, inclusive o direito de participar do governo diretamente ou por meio de representantes livremente escolhidos como reconhecido na Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948 e no Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de 1966;

3) Os governos devem acelerar a implementação dos compromissos para fazer avançar a igualdade de gênero e direitos das mulheres, inclusive mediante a revogação de leis discriminatórias e eliminação de barreiras formais, reforma de instituições e elaboração e adoção de medidas inovadoras para abordar práticas informais e culturais que atuem como barreiras;

4) Os governos devem considerar o estabelecimento de um fundo global para educação. Esse fundo deve ser destinado a atrair o apoio de governos, organizações não governamentais e do setor privado, evoluir da atual Parceria Global para a Educação do Banco Mundial e receber a tarefa de fechar a lacuna da educação primária até 2015, de modo que haja uma esperança real para a realização do Objetivo 2 de Desenvolvimento do Milênio;

5) Os governos devem aumentar seus esforços para atingir o Objetivo 2 de Desenvolvimento do Milênio em educação primária universal até 2015 e estabelecer a meta de prover acesso universal à educação pós-primária e secundária de qualidade no máximo até 2030, enfatizando as qualificações e o conhecimento necessário para empregos e crescimento sustentáveis;

6) Os governos, o setor privado, a sociedade civil e os parceiros de desenvolvimento internacional relevantes devem trabalhar juntos para prover treinamento vocacional, reciclagem e desenvolvimento profissional no contexto da aprendizagem contínua para toda a vida voltada ao preenchimento das lacunas de qualificações em setores essenciais para o desenvolvimento sustentável. Devem priorizar mulheres, jovens e grupos vulneráveis nesses esforços;

7) Os governos devem adotar e avançar as políticas de “empregos verdes” e de trabalho decente como uma prioridade em seus orçamentos e estratégias de desenvolvimento sustentável, ao mesmo tempo em que criam condições para novos empregos no setor privado;

8) Os governos e empresas devem firmar parcerias e prestar serviços de lançamento de empresas para jovens empreendedores;

9) Os empregadores, governos e sindicatos devem usar uma abordagem abrangente para promover a igualdade no local de trabalho, inclusive pela adoção de princípios de não discriminação; medidas para o avanço de mulheres em funções de liderança; políticas profissionais e de saúde sensíveis ao gênero; educação, treinamento e desenvolvimento profissional, visando às mulheres e minorias; e compromissos para medir o progresso e informa-lo ao público;

10) Os governos e empresas devem reconhecer os benefícios econômicos de possibilitar a participação plena de mulheres na economia pela implementação de políticas econômicas que abordem explicitamente os desafios únicos que limitam as mulheres;

11) Os governos e outras autoridades públicas devem promover processos abertos, transparentes, equilibrados e baseados na ciência para desenvolver esquemas de rotulagem e outros mecanismos que reflitam integralmente o impacto da produção e consumo e trabalhar com o setor privado para assegurar que a rotulagem, a apresentação de relatórios corporativos e as atividades de apoio sejam precisos, eficazes em relação ao custo e confiáveis, de modo a possibilitar que os consumidores façam escolhas informadas, particularmente em áreas de alto impacto sobre sistemas humanos e naturais, sem criar barreiras ao comércio;

12) Os governos devem fazer com que as escolhas sustentáveis sejam mais facilmente disponíveis, acessíveis e atraentes aos consumidores mediante o estabelecimento, junto com o setor privado, de normas para produtos sustentáveis, de acordo com a melhor tecnologia disponível e sem criar barreiras comerciais e pela aplicação de incentivos e desincentivos de preços;

13) O governo e as entidades não governamentais devem promover os conceitos de desenvolvimento sustentável e consumo sustentável e estes devem ser integrados aos currículos da educação primária e secundária;

14) O Painel acolhe as discussões sobre as dimensões éticas do desenvolvimento sustentável na Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio +20) em 2012 entre todas as partes interessadas, com base em experiências e instrumentos relevantes, inclusive a Carta da Terra, para subsidiar os governos em seus esforços para a mudança em direção ao desenvolvimento sustentável;

15) Os governos e organizações internacionais devem trabalhar para criar uma nova revolução verde – uma “revolução sempre verde” para o século XXI que vise no mínimo dobrar a produtividade enquanto reduz drasticamente o uso de recursos e evita a perda adicional de biodiversidade, perda do solo e esgotamento e contaminação da água, inclusive mediante a ampliação do investimento em pesquisa e desenvolvimento agrícola, para assegurar que pesquisas avançadas sejam rapidamente levadas do laboratório para o campo. Os governos devem designar a FAO para trabalhar com os parceiros e participantes essenciais para iniciar e coordenar esta tarefa, já que esta organização tem o mandato singular de reduzir o déficit alimentar mundial;

16) Os governos devem trabalhar para chegar a um acordo sobre os princípios globais para negócios sustentáveis e responsáveis de investimento em terras e água, incluindo esforços contínuos para promover o investimento agrícola responsável (IAR), com ênfase particular na proteção dos direitos e sustento de pessoas pobres que dependem desses recursos básicos, ao mesmo em tempo em que asseguram a sustentabilidade ambiental;

17) Os governos devem estabelecer e aumentar os esquemas de gerenciamento integrado de recursos hídricos, tendo em mente que a água tem papéis multifacetados, incluindo bebida, saneamento, indústria, agricultura e energia;

18) Os governos devem se comprometer com o estabelecimento de arcabouços regionais de gestão costeira e dos oceanos nos principais ecossistemas marinhos;

19) Quando as organizações regionais de gestão da pesca estiverem operantes, devem procurar tornar suas políticas e práticas compatíveis com a gestão coordenada dos oceanos regionais, apoiando-o. Organizações regionais de gestão da pesca, governos e gestores marinhos devem concentrar-se em uma abordagem ecossistêmica para a gestão da pesca a fim de proporcionar melhores benefícios econômicos e ambientais;

20) Os governos devem trabalhar em conjunto com as partes interessadas para assegurar o acesso universal à energia sustentável de custo acessível até 2030, bem como buscar dobrar a taxa de melhoria da eficiência energética e da parcela de energia renovável na matriz de energia global. Os governos e organizações internacionais devem promover tecnologias de economia de energia e energia renovável mediante o incentivo à pesquisa e desenvolvimento e investimento neste sentido;

21) Os governos devem trabalhar com as partes interessadas para prover aos cidadãos, especialmente àqueles que se encontram em áreas remotas, acesso às tecnologias, incluindo redes universais de telecomunicações e banda larga, até 2025;

22) Os governos, instituições financeiras internacionais e grandes empresas devem ser estimulados a participarem da cooperação internacional para o desenvolvimento sustentável orientado à inovação e à tecnologia em uma maior escala, melhorando a capacidade tecnológica dos países em desenvolvimento e aproveitando integralmente as funções potenciais desempenhadas por tecnologias que visam reduzir o impacto sobre clima ao lidar com a mudança climática global e ao desenvolver uma economia ecológica. Os acordos obtidos sob a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança Climática em Cancun e Durban representam um bom passo nessa direção;

23) Os países devem trabalhar para assegurar que todos os cidadãos tenham acesso às redes básicas de segurança mediante esforços nacionais apropriados e do fornecimento de capacidades, fundos e tecnologias apropriadas;

24) Os governos devem elaborar e implementar políticas para gerenciar os impactos econômicos e sociais da transição e fortalecer a resiliência – particularmente mediante programas e políticas dirigidos de proteção social e pelo aumento da capacidade humanitária de lidar com o crescente estresse ambiental e os choques potenciais, onde apropriado;

25) Os governos e organizações internacionais devem acelerar seus esforços para produzir avaliações regionais de exposição e vulnerabilidade e estratégias apropriadas de precaução para prevenir impactos adversos sobre sistemas sociais e naturais que estejam totalmente concentrados nas necessidades das pessoas, com prioridade às necessidades especiais da África, países em desenvolvimento que sejam pequenas ilhas, países menos desenvolvidos e países em desenvolvimento sem acesso ao mar;

26) Os governos e organizações internacionais devem aumentar os recursos alocados à adaptação e redução de riscos de desastres e integrar o planejamento para resiliência em seus orçamentos e estratégias de desenvolvimento;

27) Os governos devem estabelecer sinais de preço que valorizem a sustentabilidade para orientar as decisões de consumo e investimento dos domicílios, das empresas e do setor público;

28) Os governos, outras instituições públicas como universidades e organizações internacionais devem desenvolver critérios de desenvolvimento sustentável para suas compras, visando que nos próximos 10 anos as compras se tornem sustentáveis e eficazes em relação ao custo e devem emitir relatórios públicos anuais sobre seu progresso a partir de 2015;

29) Os governos devem desenvolver normas para a produção e extração de recursos para apoiar a transição para uma economia global sustentável. Devem ainda estimular a ampla adoção e incorporação pelas empresas de princípios voluntários de sustentabilidade derivados de acordos e convenções internacionais;

30) Os governos devem promover e incentivar a inclusão de critérios de desenvolvimento sustentável de longo prazo em investimento e transações conduzidas por empresas, incluindo transações financeiras. Grupos empresariais devem trabalhar com os governos e agências internacionais para desenvolver uma estrutura para os relatórios de desenvolvimento sustentável e devem considerar o relatório obrigatório para as empresas com capitalizações de mercado acima de $100 milhões;

31) As empresas devem buscar alinhar suas práticas de negócios aos princípios universalmente aceitos relativos a direitos humanos, mão de obra, sustentabilidade ambiental e combate à corrupção, tais como os estabelecidos no Pacto Global;

32) Devido à importância dos grandes fundos de capital privado e soberano para possibilitar a transição para o desenvolvimento sustentável, instamos as entidades abaixo a explorarem uma série de medidas para aplicação dos critérios de desenvolvimento sustentável;

33) Os governos, instituições internacionais e bancos de desenvolvimento internacionais devem aumentar seus esforços para promover o desenvolvimento sustentável e avaliar e monitorar adequadamente as consequências de suas políticas nas esferas social e ambiental. Bancos de desenvolvimento multilaterais e regionais e agências de crédito de exportação devem aplicar critérios de desenvolvimento sustentável, ao consideram os riscos do país;

34) Os governos e empresas devem firmar parcerias estratégicas entre eles e as comunidades locais para efetuarem investimentos em desenvolvimento sustentável;

35) Os governos, instituições financeiras internacionais e grandes empresas devem trabalhar juntos para criar incentivos para aumentar os investimentos em tecnologias sustentáveis, inovações e infraestruturas, inclusive mediante a adoção de políticas e metas que reduzam a incerteza dos investidores; a promoção de redes público-privadas para apoiar a pesquisa e desenvolvimento; a elaboração de esquemas de garantia de risco e o fornecimento de capital de risco e o financiamento inicial de empresas;

36) Os governos devem usar o investimento público para criar ambientes propícios que catalisem financiamento adicional substancial do setor privado, por exemplo, mediante o fornecimento de infraestrutura, partilha de riscos, financiamento para cobrir os déficits de viabilidade ou compromissos antecipados de compra;

37) Os governos devem buscar incentivar investimentos em desenvolvimento sustentável conformando os cálculos de investidores em relação ao futuro particularmente por meio do maior uso de mecanismos de partilha de riscos e o aumento da certeza sobre o ambiente regulatório e de políticas de longo prazo. As medidas podem incluir metas para energia renovável ou conservação, redução de resíduos, conservação da água, acesso a mercados de carbono por meio do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo do Protocolo de Quioto ou perspectivas sustentadas para o financiamento público;

38) Os governos e o setor financeiro devem desenvolver parcerias inovadoras para proporcionar capacitação e maior acesso ao capital, como uma maneira de incentivar pequenas e médias empresas e permiti-las participar da nova economia sustentável;


39) Para medir os progressos alcançados no desenvolvimento sustentável, deve ser elaborado um índice de desenvolvimento sustentável ou um conjunto de indicadores até 2014. Para este fim, o Secretário-Geral deve indicar uma força tarefa técnica, incluindo as partes interessadas;

40) Como base para o desenvolvimento sustentável, os governos devem assegurar o estado de direito, a boa governança e os direitos de acesso dos cidadãos a informações oficiais, participação pública em tomada de decisões e acesso igual à justiça;

41) Os governos devem possibilitar a participação e a influência dos jovens nos processos decisórios nos níveis local, nacional e internacional. Ademais, os processos de consulta e diálogo devem ser estimulados para incorporar vozes de redes não convencionais e comunidades de jovens, tais como fóruns da internet e blogs formadores de opinião;

42) Os governos devem adotar abordagens para as questões de desenvolvimento sustentável que incluam todo o governo, sob a liderança do Chefe de Estado ou de Governo, envolvendo todos os ministérios relevantes para tratar dessas questões nos setores;

43) Os governos e parlamentos devem incorporar a perspectiva de desenvolvimento sustentável em suas estratégias, sua legislação e, em particular, nos seus processos orçamentários. Para este fim, devem ser levadas em conta as dimensões econômicas, sociais e ambientais de questões como a erradicação da pobreza, criação de empregos, redução da desigualdade, padrões insustentáveis de consumo e produção, energia, mudança climática, biodiversidade e crescimento verde. Devem explorar maneiras de incorporar considerações específicas de sustentabilidade na supervisão orçamentária, elaborar relatórios públicos sobre as atividades relevantes e disponibilizar os orçamentos a seus cidadãos;

44) Devem ser tomadas medidas para fortalecer a interface entre a formulação de políticas e a ciência para facilitar a tomada de decisões políticas informadas sobre questões relacionadas ao desenvolvimento sustentável. Os representantes da comunidade científica podem ser incluídos como membros ou assessores em órgãos nacionais ou locais relevantes que tratam das questões de desenvolvimento sustentável;

45) O Painel reconhece a aspiração universal de alcançar o desenvolvimento sustentável. Reconhece também a diversidade de circunstâncias nacionais e de desafios sociais, econômicos e ambientais. O Painel insta que se crie um processo para explorar o conceito e aplicação da questão crítica da igualdade em relação ao desenvolvimento sustentável, visando incorporar o resultado no processo da Rio +20 e seus desdobramentos;

46) Os doadores bilaterais, instituições internacionais e bancos de desenvolvimento devem intensificar seus esforços para promover o desenvolvimento sustentável de maneira abrangente e devem monitorar e informar regularmente o impacto das suas políticas de desenvolvimento sustentável;

47) Como a política de desenvolvimento sustentável internacional é fragmentada e, em particular, o pilar ambiental é fraco, o PNUMA deve ser fortalecido;

48) Os governos devem concordar em desenvolver um conjunto de metas básicas universais de desenvolvimento sustentável, incluindo as três dimensões de desenvolvimento sustentável, bem como suas interconexões. Essas metas devem galvanizar a ação individual e coletiva bem como complementar os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, ao mesmo tempo em que permitem uma estrutura pós-2015. Um mecanismo especializado deve ser estabelecido pelo Secretário-Geral para detalhar e refinar as metas antes de sua adoção pelos Países-Membros das Nações Unidas;

49) O Painel endossa a iniciativa “Energia Sustentável para Todos” do Secretário-Geral, que deve ser implementada sem demora;

50) O Secretário-Geral deve liderar um esforço conjunto com os chefes das organizações internacionais relevantes, incluindo as agências relevantes das Nações Unidas, instituições financeiras internacionais, setor privado e outras partes interessadas, para preparar um relatório periódico do panorama do desenvolvimento sustentável global que reúna informações e avaliações atualmente dispersas nas instituições e as analise de maneira integrada;

51) Os governos e a comunidade científica devem tomar medidas práticas, inclusive mediante o lançamento de uma grande iniciativa científica global, para fortalecer a interface entre as políticas e a ciência. Isto deve incluir a preparação de avaliações e resumos regulares sobre a base científica de conceitos, como “fronteiras planetárias”, “pontos de inflexão” e “limites ambientais” no contexto do desenvolvimento sustentável. Isto complementaria outros trabalhos científicos na agenda de desenvolvimento sustentável, incluindo seus aspectos econômicos e sociais, para aperfeiçoar os dados e o conhecimento sobre fatores socioeconômicos como a desigualdade. Ademais, o Secretário-Geral deve considerar a nomeação de um assessor científico chefe ou estabelecer um conselho consultor científico com conhecimento e experiência diversificados para assessorá-lo e a outros órgãos das Nações Unidas;

52) Os governos devem considerar a criação de um conselho mundial de desenvolvimento sustentável para melhorar a integração das três dimensões de desenvolvimento sustentável, abordar questões emergentes e rever o progresso da sustentabilidade, com reuniões periódicas ao longo do ano. Esse órgão pode ser um órgão subsidiário da Assembleia Geral e substituiria a Comissão de Desenvolvimento Sustentável. Precisaria ter uma ampla representação geográfica e política e a participação plena das instituições internacionais relevantes – inclusive agências das Nações Unidas e instituições financeiras internacionais – assim como atores não estatais da sociedade civil, do setor privado e da comunidade científica;

53) Esse conselho desenvolveria um mecanismo de revisão por pares que estimularia os Estados, em um espírito construtivo, a explicarem suas políticas, compartilharem experiências e lições aprendidas e cumprirem seus compromissos;

54) Os governos devem também usar as instituições existentes de uma maneira mais dinâmica, inclusive usando o período entre a realização da Rio +20 e 2015 para revisão e experimentação, a fim de incorporar as soluções testadas às estruturas de desenvolvimento pós-2015 e reformas institucionais;

55) O Secretário-Geral deve acelerar o desenvolvimento de uma estratégia de desenvolvimento sustentável para o sistema das Nações Unidas de modo a contribuir à coerência, melhor definir as responsabilidades entre os órgãos das Nações Unidas, reduzir a sobreposição e duplicação de esforços e melhorar a prestação de contas da implementação. A estratégia deve ser revista por todos os órgãos relevantes e conselhos diretores das Nações Unidas, envidando esforços especiais para forjar uma visão unificada entre os países, que seja comum a todos os conselhos e processos;

56) O Secretário-Geral deve fazer pleno uso das Nações Unidas como espaço mundial de reunião, convocando intercâmbios de alto nível sobre desenvolvimento sustentável quando os líderes se reunirem na abertura da nova sessão da Assembleia Geral. Essas reuniões devem ser usadas para estabelecer a agenda e abordar as questões emergentes reunindo os chefes de estado ou de governo, os chefes de instituições internacionais e representantes da sociedade civil e do setor privado.

 
Referência:

Povos Resilientes, Planeta Resiliente: um Futuro Digno de Escolha www.onu.org.br/docs/gsp-integra.pdf

José Eustáquio Diniz Alves, Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE.

Fonte: EcoDebate

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Um breve panorama brasileiro da reciclagem de eletroeletronico.



O cenário da reciclagem dos eletroeletrônicos no Brasil evoluiu bastante nos últimos anos. E, levando-se em conta a implementação das políticas de resíduos sólidos nos níveis federal (PNRS), estadual e municipal, ainda podemos esperar muitas melhorias para o futuro próximo.

Os Resíduos de Equipamentos EletroEletrônicos (REEE), como outros resíduos, são definidos como responsabilidade compartilhada entre todos os atores envolvidos no consumo: fabricantes, distribuidores, comerciantes e consumidores. Em função do risco associado ao descarte incorreto dos REEE, eles foram tratados de forma especial dentro do PNRS e portanto também o serão nos outros níveis da federeção.

Nesse momento, os fabricantes, reunidos em suas associações, como Abinee e Eletros, discutem como estabelecer um plano em nível nacional.

Enquanto isso, diversos grupos sociais já se mobilizaram e criaram soluções parciais para o problema. Para se entender como estão organizados os atores envolvidos nessa cadeia, precisa-se primeiro compreender como se dividem as atribuições de cada um. A primeira etapa do que podemos chamar de “cadeia da reciclagem”, que é a mais complexa e onerosa, consiste na coleta dos produtos descartados. Basta imaginar que é necessário cobrir todo o território nacional, oferecendo pontos de coleta onde podem ser entregues quaisquer tipos de produtos, incluindo-se, por exemplo, TVs, geladeiras, computadores e telefones celulares. Em seguida, depois de se ter o descarte reunido, ocorre a manufatura reversa, que inclui a desmontagem de cada equipamento e a separação de partes e peças por tipo de cada matéria-prima que o compõe. Por fim, cada resíduo classificado é processado por um tipo de indústria, vindo a se tornar novamente matéria-prima que alimenta a indústria para novos produtos.

O mercado de resíduos, antes chamado simplesmente de lixo, sempre foi explorado por catadores e sucateiros. Esses grupos há muito tempo sabem transformar o que recebem ou coletam em materiais de valor, mesmo correndo riscos de saúde. Durante décadas as questões ambientais e de segurança do trabalho foram relegadas a segundo plano. No começo dos anos 2000 é que os impactos da indústria de eletroeletrônicos passaram a ser mais seriamente considerados, inclusive com estudos mais profundos4. Com o entendimento de que os REEE são resíduos perigosos para as pessoas e o meio-ambiente, empresas mais capacitadas para tratar de forma adequada dos resíduos começaram a ocupar o mercado, executando as atividades desde a coleta até a transformação em matérias-primas ou sua disposição final em locais adequados.

Alguns fabricantes de produtos com responsabilidade social e ambiental têm contratado os serviços desses recicladores capacitados para tratar de seus resíduos. Outras empresas, com nível menor de comprometimento ou recursos, têm se servido de recicladores que não apresentam qualificação adequada. Por fim, o cidadão comum, quando não sabe claramente como proceder, utiliza-se de entidades filantrópicas que aceitam seus produtos usados como doação ou simplesmente descarta em locais inadequados junto com o lixo orgânico.

Devido à presença de diversos elementos químicos prejudiciais à saúde humana, para a reciclagem correta dos REEE incorrem custos relevantes. As despesas estão relacionadas com o tratamento dos tubos dos monitores de computador (conhecidos como CRT) e também das TVs, que precisam ser descontaminados do chumbo e fósforo que os compõe. O custo desse processo é maior que o preço obtido com a venda das matérias-primas obtidas. Outra despesa considerável é provocada pela retirada correta dos gases CFC e correlatos, presentes nos refrigeradores e aparelhos de ar condicionado. Caso o procedimento correto não seja executado, os gases desprendem-se na atmosfera, aumentando a destruição da camada de ozônio. Esses gases precisam ser posteriormente neutralizados através de processos cujos custos são significativos.

As empresas fabricantes de eletroeletrônicos e responsáveis social e ambientalmente, exigem certificados de suas parceiras recicladoras, sendo que a geração de certificados também apresenta custos inerentes devido aos sistemas de informação e à mão-de-obra especializada. Não menos relevante em todo esse processo é uma considerável demanda por deslocamentos de material, outro fator representativo dos custos de operação. Por tudo isso, os recicladores responsáveis têm cobrado pelos seus serviços.

O mercado da reciclagem dos REEE está concentrado na região Sudeste, onde se encontra o maior mercado consumidor e, consequentemente, o maior descarte. Em seguida, vem a região Sul sendo que as demais regiões brasileiras estão bastante desasistidas, apresentando iniciativas pontuais. E, a maior parte do material a ser reciclado precisa ser enviado para a região Sudeste, provocando um claro impacto nas emissões de CO2 e aumento nos custos do processo.

O governo federal é também um grande gerador de REEE, possuindo um parque eletroeletrônico bastante considerável. Interessado em certificar as empresas de reciclagem para si e o mercado, o governo tem apoiado a criação de uma norma desenvolvida sob o guarda-chuva da ABNT. Ao obter a certificação em gestão ambiental para reciclagem de eletroeletrônicos, as empresas que atuam na “cadeia da reciclagem” poderão prestar serviços ao governo e outros interessados, simplificando processos de homologação e comprovação de idoneidade.



*Enio Blay, 46 anos, é empreendedor e inovador, sócio da renergia, empresa de reciclagem de eletroeletrônicos. Com 20 anos de experiência em redes de computadores e desenvolvimento de software, trabalhou em empresas brasileiras, multinacionais e institutos de pesquisa. É graduado em Engenharia Elétrica pela Escola Politécnica da USP e mestrado em Gerenciamento de Redes de Computadores pela UFSC. Atualmente cursa MBA em Sustentabilidade e TI no Laboratório de Sustentabilidade (LASSU) da Escola Politécnica da USP.


Fonte: Revista Sustentabilidade







sexta-feira, 1 de junho de 2012

BIODIGESTORES




Os biodigestores são tanques protegidos do contato com o ar atmosférico, onde a matéria orgânica contida nos efluentes é metabolizada por bactérias anaeróbias (que se desenvolvem em ambiente sem oxigênio). Neste processo, os subprodutos obtidos são o gás (Biogás), uma parte sólida que decanta no fundo do tanque (Biofertilizante), e uma parte líquida que corresponde ao efluente mineralizado (tratado).

O Biogás é um gás inflamável produzido por microorganismos, quando matérias orgânicas são fermentadas dentro de determinados limites de temperatura, teor de umidade e acidez, em um ambiente impermeável ao ar. Seu principal componente é o gás metano que, uma vez queimado nos aterros sanitários, é transformado em dióxido de carbono (CO2) e água.

A tecnologia de biodigestores já tem pelo menos duas décadas no Brasil. Iniciou-se com modelos provenientes da China e Índia. No entanto, o Brasil teve algumas dificuldades na sua implementação, fazendo com que esta tecnologia caísse no descrédito no meio rural.

Nestas duas décadas houveram avanços tecnológicos significativos que possibilitaram a solução de várias dificuldades. Assim, o modelo de biodigestor adotado para o Biossistema Integrado agrega avanços, além de levar em conta a simplicidade de manejo e baixo custo de construção.

O princípio de funcionamento dos biodigestores se baseia no processo anaeróbio. Se trata de um ambiente criado de forma artificial e favorável ao desenvolvimento de bactérias anaeróbias. Existem vários modelos de biodigestores, sendo que cada um é adequado aos diferentes tipos de resíduos obtidos no meio rural, podendo ser operados com cargas contínuas ou batelada. Entre os vários tipos, os mais utilizados são os biodigestores indianos; chineses; fluxo tubular e o tipo batelada.

Utilização dos biodigestores

Os objetivos para se utilizar os biodigestores são variados:

•Podem ser empregados na obtenção de combustível de alta qualidade para as áreas rurais, sendo, ao mesmo tempo, preservado o valor do efluente como adubo;

•Podem atender ao duplo objetivo de produção de energia e de tratamento de dejetos, principalmente de animais em fazendas, o que possibilita o manuseio de um material sem odores.

O Brasil dispõe de condições climáticas favoráveis (clima tropical, os digestores dispensam sistemas adicionais para aquecimento) para explorar a energia derivada dos dejetos animais e restos de cultura, além de liberar o gás de bujão e o combustível líquido (querosene, gasolina, óleo diesel) para a população urbana, aliviando o país, com isso, de uma significativa parcela de importação de derivados do petróleo.

O mesmo biodigestor que trata os dejetos vindos do estábulo, da pocilga ou do confinamento de bovinos pode ser ligado ao esgoto doméstico das residências. Embora sejam usados primordialmente como fonte de energia e de fertilizantes orgânicos para produtores rurais, os biodigestores também podem ser empregados como um sistema de tratamento de esgotos humanos para pequenas comunidades urbanas.

Tipos de biodigestores

Biodigestor anaeróbico tubular - é composto de caixa de entrada: parte do biodigestor em que é feito o carregamento dos resíduos animais e vegetais. Os resíduos podem ser submetidos a uma trituração e diluídos com água até atingirem o teor adequado de umidade (90 a 95% de água).

- Biodigestor propriamente dito: dentro do biodigestor, na área de entrada de materiais, processa-se inicialmente uma fermentação aeróbica ácida na qual os açúcares simples presentes no material são fermentados e se transformam em acetato (ou ácido acético). No corpo do biodigestor passa a ocorrer uma fermentação anaeróbica concomitante. As bactérias que produzem acetato usam todo o oxigênio presente na carga inicial e o ambiente interno do biodigestor tende a ficar anaeróbico e as bactérias que sobrevivem são apenas as anaeróbicas. Elas utilizam o acetato em seu metabolismo e o transformam em metano. O ambiente torna-se totalmente anaeróbico e a formação de biogás ganha a maior eficiência. O dimensionamento do biodigestor deve permitir a retenção da biomassa. O nível de DBO (Demanda Biológica de Oxigênio) do líquido em fermentação declina e ele começa a se transformar em biofertilizante.

- Caixa de saída: cada volume de carga na entrada corresponde à saída do mesmo volume de líquido do biodigestor. Este líquido deve ser armazenado em condições aeróbicas para que, sob a ação de bactérias nitrificantes, sofra uma última e drástica redução do seu nível de DBO. Estas reações bioquímicas finais resultam na formação do biofertilizante. Como também deve estocar o produto, este tanque aberto deve ter capacidade de armazenar cerca de 30 dias de produção do biodigestor.

Biodigestor de batelada ou de fluxo não contínuo - O batelada é mais simples de ser construído, composto apenas pela câmara de biodigestão cilíndrica, que é feita de alvenaria, e pelo gasômetro móvel, com formato cilíndrico e cobertura abaulada, construído de material metálico. Muito útil em situações em que a remoção dos dejetos não é feita diariamente, como ocorre na avicultura de corte, onde os dejetos são retirados das granjas ao final de cada período de produção, o que dura, em média, 60 dias.

Fonte: EcoDesenvolvimento.org