Desoneração tributária, políticas públicas de incentivo à coleta seletiva e uso de tecnologia de ponta no processamento de resíduos domésticos e industriais foram os caminhos apontados para solucionar o problema do lixo no debate “Indústria da Reciclagem: impactos sociais, econômicos e ambientais”, realizado pelo Fórum de Desenvolvimento do Rio. O evento encheu o plenário e as galerias da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) e contou com a presença de representantes do governo estadual, do vice-prefeito da capital e de prefeitos de municípios do interior, bem como empresas que trabalham com reciclagem e aproveitamento de resíduos, e representantes de associações de catadores de lixo. Um ponto uniu o discurso de todos os palestrantes presentes: o desafio representado pelas 15 mil toneladas de lixo produzidas todos os dias no estado só vai ser solucionado alinhando regulação estatal, poder de investimento da iniciativa privada, inclusão social e fomento à transição para técnicas mais modernas de tratamento de lixo.
Para o presidente da Alerj e do Fórum, deputado Jorge Picciani (PMDB), é preciso trabalhar a favor da sustentabilidade ao mesmo tempo em que se busca atrair novas empresas, gerar empregos e aumentar a renda da população. “Transformar o que resta de um dia de consumo de um indivíduo em emprego, saúde, novos produtos e evitar com isso enchentes e proliferação de doenças é papel de todos”, afirma Picciani. Ele lembra que somente na região metropolitana do Rio de Janeiro 40 mil pessoas vivem do dinheiro conseguido na coleta de lixo. “Muitas vezes elas começam o seu trabalho depois que todos nós já fomos dormir. Catam o material reciclável e o vendem aos depósitos ou a intermediários, que revendem depois para empresas de reciclagem”, explica a deputado.
Desoneração tributária une governo, ONGs e parlamentares
A desoneração tributária é um das principais medidas defendidas tanto pelo Governo, quanto por ONGs e parlamentares. A secretária estadual do Ambiente, Marilene Ramos, responsável pela primeira palestra do debate, afirmou que a desoneração da cadeia produtiva da reciclagem é uma questão que está na pauta nacional e que pode gerar impactos em todo o estado. O presidente Lula já anunciou que pretende enviar ao Congresso Nacional um pacote com medidas de desoneração às chamadas empresas da reciclagem, termo que engloba recicladores, usinas de processamento e as empresas que usam matéria prima reciclada na confecção dos produtos finais. Enquanto a legislação nacional não chega, uma das sugestões apresentadas no debate foi o estado do Rio de Janeiro se adiantar e implementar incentivos fiscais específicos para a reciclagem.
“Por que o Rio de Janeiro não assume a dianteira e implementa de uma vez incentivos à indústria da reciclagem? Ficamos felizes em ver que tanto o Governo estadual quanto o Legislativo avaliam com simpatia o uso de renuncia fiscal como instrumento para fomentar a reciclagem”, afirmou o presidente da Associação Estadual dos Recicladores do Estado do Rio de Janeiro (Arerj), Edson Freitas, durante a sua palestra, defendendo essa como a medida que traria mais impacto para alavancar a reciclagem no estado. O deputado Paulo Ramos (PDT) também a apóia. “Antes de virar resíduo, o produto já pagou impostos ao longo de todo o processo produtivo, da matéria-prima à comercialização”, defendeu o deputado.
Políticas públicas
A regulação estatal não se faz necessária apenas para garantir isenção de impostos. A adoção de políticas públicas permanentes para aumentar a coleta seletiva é considerada um gargalo para aumentar o reaproveitamento de resíduos. Estimativas da Secretaria Estadual do Ambiente apontam que 40% do lixo pode ser reciclado, mas apenas 1% é de fato transformado em outros produtos. A separação dos resíduos atualmente é feita pelas cooperativas de catadores, mas poderia ganhar escala se fosse encampada como meta prioritária pelos municípios, que são os responsáveis pela coleta de lixo.
A prioridade atual no estado Rio, no entanto, tem sido a política de substituição dos lixões por aterros sanitários estruturados por meio de consórcios intermunicipais. O estado do Rio tem atualmente 8 aterros sanitários, mas esse número deve aumentar para 13 nos próximos meses. “Vivemos um período de transição no estado do Rio. Os aterros sanitários são a solução economicamente viável no momento e já representam uma evolução em relação à situação atual do lixo”, afirma a secretária do Ambiente, Marilene Ramos. Ela explicou que a implantação em massa de usinas de processamento de lixo, seja para transformação em fertilizante ou geração de energia, tem custos acima do que o estado pode arcar. Ela estima que os aterros sanitários tenham custo de cerca R$50 por tonelada, ao passo que as usinas custam até R$ 120 por tonelada de lixo. “Estamos saindo de uma situação praticamente medieval, com lixões a céu aberto e aterros controlados que custam até R$20 por tonelada”, afirma Marilene. Ela avalia que em duas ou três décadas, justamente o tempo de vida útil de um aterro tradicional, o governo do estado já tenha condições de fazer a transição para as usinas de processamento mais modernas.
Tecnologia de ponta
A nova fronteira para a questão do lixo e destinação de resíduos sólidos é o uso de usinas de processamento de resíduos. Algumas incineram o material e o transformam em energia elétrica ou térmica. Outras já desenvolveram técnicas para transformar o lixo em fertilizante. Durante o debate desta segunda-feira, o professor e pesquisador da Coppe/UFRJ, Claudio Mahler, apresentou exemplos de países europeus que já estão na fase de transição dos aterros para as usinas de processamento e reciclagem. A Inglaterra já consegue processar 38% de todos os resíduos, enquanto a Alemanha investiu pesado na implantação de usinas de energia elétrica. Aqui mesmo no Brasil, a empresa mineira Geociclo é um exemplo do uso da biotecnologia a serviço da sustentabilidade. A empresa criou e patenteou tecnologia totalmente nacional que faz fertilizantes orgânico e organominerais a partir do lixo. Na prática, significa dizer que o passivo ambiental é convertido em ativo econômico. Ernani Judice, diretor da Geociclo, durante a sua palestra no plenário da Alerj, destacou as vantagens da técnica. “O lixo, que era um problema, passa a ser uma solução com a produção de fertilizantes para a agricultura”, completa Judice.
Questão social
O presidente da Associação de Catadores de Lixo, Sebastião dos Santos, que também participou do debate, chamou atenção para a dimensão social. Nas últimas décadas a reciclagem tem sido possível graças à existência de um exército de pessoas que se dedicam a separar o material e revendê-lo. “Os catadores são protagonistas nesse debate, queremos que nossos direitos sejam respeitados”, afirma, defendendo que as prefeituras encarem a coleta seletiva como uma política pública permanente, e não como um projeto de inclusão social. Em relação ao fechamento dos lixões, ele foi enfático: “Para cada lixão fechado, deveria ser criado um fundo para os catadores que ficaram sem local para continuar suas atividades”.
Redenoticia.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário