Mortalidade infantil, doenças e epidemias são os prejuízos visíveis da falta de saneamento.
Absenteísmo, atraso escolar, degradação ambiental, perda de atividade econômica, dentre outros, são os malefícios da precariedade do saneamento básico disseminados por toda a sociedade. Novo estudo realizado pelo Instituto Trata Brasil em parceria com o Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas, nas áreas de Educação, Trabalho e Turismo, revela outras vertentes dos impactos da falta desse serviço público na qualidade de vida e no desenvolvimento da população brasileira. A pesquisa foi até os bairros e distritos de mais de vinte localidades dos Estados do Norte, Nordeste, Sudeste e Sul.Apesar de ter avançado no combate à desigualdade e à pobreza, passando a figurar no grupo de países com Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) alto, ainda é preciso maior conscientização sobre os impactos sociais e econômicos da falta de saneamento, alerta Luis Fernando Felli, presidente do Trata Brasil, ONG criada no ano passado com o objetivo de mobilizar os diversos segmentos da sociedade para garantir a universalização do saneamento no país.De acordo com o estudo, o mesmo impacto que a expansão do saneamento básico pode provocar sobre a saúde das pessoas, e das crianças em particular, pode ser identificado no caso da educação quando se analisam os dados da permanência dos alunos nas escolas.O impacto sobre a educação População 0-17 anosSuplemento da Pnad de 2006, divulgado em 2008, apresenta informações complementares de educação que demonstram que o principal motivo de falta às aulas entre os estudantes de 0 a 17 anos é a doença (59%). Destes, 44,9% faltaram pelo menos um dia e 18,2% faltaram seis dias ou mais. Os índices de matrícula, também de 0 a 17 anos, atingem 75,8%. Essa baixa permanência na escola é ainda mais reduzida por motivos de saúde. A pesquisa utiliza o Índice de Permanência na Escola (IPE) proposto pelo Centro de Políticas Sociais da FGV para analisar como a falta de saneamento básico afeta o desempenho escolar. No cruzamento dos dados, os pesquisadores descobriram, logo de início, que o índice de matrícula para a população sem saneamento (0,7446) era, na amostra, menor que a da população servida de água e esgotamento sanitário (0,7955). O cálculo final, incorporadas as dimensões Índice de Presença e Desvio de Jornada, indica que a população até 17 anos sem saneamento apresenta um Índice de Permanência na Escola (IPE) significativamente menor (0,7169) que o das crianças e jovens que dispõem de saneamento (0,8404).A pesquisa detalha os resultados para diversas faixas etárias e níveis educacionais. A diferença de permanência global na escola favorável às crianças e jovens com saneamento é de 25,2% no total de pessoas de 0 a 17 anos de idade, 19,5% entre 7 e 14 anos, 22,3% para aqueles entre 15 a 17 anos, e 44,9% para aqueles entre 0 e 6 anos de idade. Os pesquisadores destacam que a faixa da primeira infância, mais atingida no índice de permanência na escola, é também a que abriga o maior número de vítimas das doenças provocadas pela falta de saneamento.O trabalho divulgado pelo Instituto Trata Brasil demonstra também que a adoção de uma estratégia de investimentos maciços em saneamento básico poderia ser vista como uma política de emprego de alto impacto.Investimentos maciços nessa área podem se tornar fonte geradora de emprego de alto impacto“É uma empreitada vantajosa”, observa o professor Marcelo Néri, coordenador da pesquisa. O estudo indica que esse tipo de estratégia tem baixo impacto negativo sobre a balança comercial e é importante na formação bruta de capital fixo, principalmente na atual conjuntura brasileira. Além disso, como são obras que podem ser exercidas em qualquer região do país e priorizam as áreas mais pobres, “atingem justamente regiões abundantes em mão-de-obra não qualificada, com altos níveis de desocupação e baixa oferta de saneamento”.A pesquisa trabalha com dados de emprego formal, em nível nacional, do Ministério do Trabalho e do Emprego, da Pnad e, nas seis principais regiões metropolitanas, da Pesquisa Mensal do Emprego. Na análise para os setores de saneamento e relacionados, verificou-se que o impacto total das atividades sobre a economia está entre os cinco primeiros, ficando abaixo apenas da agropecuária, agroindústria, administração pública e serviços privados. “Cada R$ 1 milhão investido em obras de esgoto sanitário gera 30 empregos diretos e 20 indiretos, além dos permanentes, quando o sistema entra em operação. Com o investimento de R$11 bilhões por ano, reivindicado pelo setor de saneamento, calcula-se que sejam gerados 550 mil novos empregos no mesmo período”, diz Felli, presidente do Instituto.Mas o trabalho ressalva que essa avaliação, baseada nos indicadores específicos do setor, não leva em consideração o contexto econômico mais amplo em que a atividade está inserida. Considerado o peso da cadeia produtiva da atividade, que envolve todo o macro-setor da construção, o impacto dos investimentos em saneameto básico se amplia. “O grande impacto de uma estratégia pró-saneamento não se dá na geração direta ou indireta do emprego, mas nos investimentos associados à atividade de abrir e tapar buracos das obras de infra-estrutura”, diz Néri. A participação dessa cadeia de produção é de 19% de todo o valor adicionado à economia, ao passo que a construção civil isolada participa com 6%.Outro setor beneficiado pelos investimentos em saneamento é o do turismo, revela o estudo da FGV. As condições ambientais são ativos fundamentais para o sucesso dessa atividade econômica. O investimento no turismo se reflete positivamente em várias vertentes, tais como o meio ambiente, a educação, o trabalho, a renda, a economia e a saúde das pessoas.Um turista – registra o estudo –, quando toma a decisão a respeito de um destino turístico, avalia a presença de diferentes capitais na localidade: humano, cultural, social, econômico, infra-estrutura e, no caso brasileiro, principalmente o natural (praias, paisagens, flora, fauna). “Alcança até o imaginário das pessoas,” ratifica Néri. “Qualquer um de nós se sente lesado ao ver uma praia poluída.”Mas, de acordo com o panorama construído a partir da Pnad, o acesso à rede geral de esgoto no país ainda se restringe às regiões metropolitanas litorâneas, ainda extremamente baixa em muitas regiões. O Estado de São Paulo é o que apresenta melhor infra-estrutura de saneamento em municípios e bairros turísticos.Os grandes centros urbanos que possuem as maiores taxas de saneamento estão localizados principalmente nas regiões Sul e Sudeste. Entre as capitais nordestinas, cujo peso das atividades turísticas é significativo, Salvador é a única que apresenta razoável taxa de acesso (74,38%), três vezes maior que Natal (25,46%). Os demais destinos analisados apresentam baixas taxas. “O quadro é de precariedade”, alerta Marcelo Néri, coordenador da pesquisa, “e sinaliza a morte da natureza, que representa um dos principais ativos geradores de renda dos sítios turísticos”. Dos 20 municípios turísticos analisados pelo estudo, 17 declararam sofrer algum tipo de alteração das condições de vida por meio ambiente.Assim como acontece no Brasil como um todo, a presença de esgoto a céu aberto é a situação ambiental que mais afeta a população (em 13 municípios). Outras alterações apontadas são: ocupação desordenada do território (12 municípios), contaminação de rio, baía etc. (10 municípios), presença de doenças (9 municípios) e doenças endêmicas (8 municípios).
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