domingo, 2 de janeiro de 2011

A idéia em torno do socialismo ecológico

Por Marcus Eduardo de Oliveira


Mudar radicalmente a racionalidade econômica; aproximar as preocupações da ciência econômica para a necessidade de libertar o homem; criar um novo ambiente propício para a vida de todos os seres humanos, sem a divisão costumeira que privilegia alguns em detrimento de muitos e reconhecer, definitivamente, a existência de limites ao crescimento. São esses alguns pontos centrais da discussão em torno do que se convenciona chamar socialismo ecológico; ou como alguns preferem de eco-socialismo.

Socialismo, sim, no sentido de enaltecer os laços sociais e políticos que respeitam, primeiramente, a Mãe Terra. Socialismo no sentido de fazer a crítica verdadeira ao “deus-capitalismo” que se afirma consoante a idéia básica de que o mercado, altar sagrado do dinheiro, pode tudo. Esse socialismo, aqui defendido, se põe em posição contrária a essa premissa, pois entende que o mercado é incapaz de resolver tudo e que o mundo não pode viver apenas de consumo e mais consumo, como o “deus-capitalismo” sempre quis que assim fosse e quer que assim seja.

Quem tem olhos para ver sabe que a contradição entre capital e natureza aí está posta e deve ser repensada à luz de uma nova perspectiva que inclua, essencial e preferencialmente, o ser humano dentro do objeto de análise dos modelos econômicos, partindo da premissa que o mundo não é, como dissemos, um objeto, uma simples e qualquer mercadoria pronta para ser digerida por bocas ávidas. Se o consumo consome o consumidor, o socialismo ecológico, o eco-socialismo, vem para refutar o deus-mercado e pôr novas regras no jogo, defendendo as bases de sustentação da vida, condenando, primeiramente, o consumo artificialmente induzido pela publicidade que faz a sobrevivência daquele “deus” que ora mencionamos.

Esse socialismo ecológico, defendido pelo economista mexicano Enrique Leff, pelo sociólogo Michael Lowy, por Victor Wallis, John Bellamy Foster, Jean-Marie Harribey, Raymond Willians, David Pepper e tantos outros nomes de destaque na academia, aponta para a necessidade de incutir no imaginário coletivo a verdade de que toda vez que o capital se constrói sob as ruínas da natureza é a vida de todos nós que entra em perigo. Talvez seja por isso que Enrique Leff acertadamente pontua que “a economia está gerando a morte entrópica do mundo”. Essa “morte”, em nosso entendimento, é cada vez mais explícita quando se percebe que a única preocupação dos “Senhores da Economia Mundial” é em salvar o grande capital, não em salvar o planeta e a vida. Por sinal, melhor seria dizer em salvar a vida, pois o planeta saberá viver sem nós uma vez que não depende de nossa presença para sobreviver.

Pelo lado da economia voraz e consumista, base do deus-mercado, que a tudo destrói em nome de atender aos ditames mercadológicos, somos sabedores de que a ordem da macroeconomia comandada por esses “Senhores” é uma só: fazer crescer e crescer e crescer cada vez mais a economia mundial. Do outro lado, para o bem da sobrevivência e do respeito às leis da vida, a ordem da ecologia também é una: lutar pela possibilidade de assegurar a sobrevivência de nossa espécie.

Conquanto, o fato é que já não é mais possível aceitar a prédica mercadológica que faz com que uma minoria prospera enquanto uma maioria conheça de perto o drama da exclusão numa sociedade que parece não ser de outra natureza além daquela consumista, insuflada pela propaganda, financiada pelo capital, destruidora da natureza.

Os que defendem o modelo de fazer a economia crescer sem limites para assim promover a “felicidade geral”, como se isso fosse exeqüível, e como se não houvesse nenhum tipo de diferença sócio-econômica, se equivocam ao ignorar que esse “crescimento” é dependente das leis da natureza e a natureza, em toda sua amplitude, não é (e nunca será) capaz de dar conta dessa política de crescimento.

Nesse sentido, a economia parece ser completamente míope em relação à necessidade de se regular a produção. Para o bem daqueles que se encontram ao lado da ecologia, contra a economia destruidora, cabe atentar aos preceitos desse novo pensamento que ganha, cada vez mais, contorno de paradigma que veio para ficar. Consoante a isso, analisemos a seguir o que tem dito Lowy e Bellamy Foster que trabalham a idéia de “eco-socialismo”.

O eco-socialismo
Afinal, o que é o ecossocialismo? Para Lowy, “Trata-se de uma corrente de pensamento e de ação ecológica que toma para si as conquistas fundamentais do socialismo – ao mesmo tempo livrando-se de suas escórias produtivistas”.

Já o sociólogo John Bellamy Foster definiu o eco-socialismo como sendo “a regulação racional da produção, respeitando a relação metabólica entre os sistemas sociais e os sistemas naturais, de forma a garantir a satisfação das necessidades comuns das gerações presentes e futuras”.

Portanto, a definição dada por Foster não está muito distante da recomendação feita pelo Relatório Brundtland. Para melhor ilustrar-se essa questão, três aspectos realçam o posicionamento de Foster. São eles:

* O reconhecimento dos limites ao crescimento e a ruptura com a lógica produtivista que associa o aumento do bem-estar a um aumento da produção. Colocar o prefixo eco na palavra socialismo implica conciliar a igualdade intra-geracional com a igualdade inter-geracional;
* A reformulação do sistema produtivo de forma a torná-lo dependente unicamente do uso de recursos renováveis, articulando com o princípio anterior. Cumpre ressaltar que a sustentabilidade exige um uso dos recursos renováveis a um ritmo que garanta a sua renovação;
* O uso social da natureza, privilegiando a gestão comunitária de recursos comuns.

Como visto, os termos eco-socialismo e socialismo ecológico estão longe de serem apenas modismos ou meras retóricas românticas. São, ademais, conceitos que ganham contornos relevantes num mundo que vive intensamente a mais grave crise ecológica de toda a história. Para o bem de todos nós, o pensamento em defesa da sustentabilidade se fortalece no dia a dia. A natureza e a vida agradecem.

Marcus Eduardo de Oliveira é economista e professor de economia da FAC-FITO e do UNIFIEO, em São Paulo. Membro do GECEU – Grupo de Estudos de Comércio Exterior (UNIFIEO) e articulista do Portal EcoDebate, do site “O Economista” e da Agência Zwela de Notícias (Angola).

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